Política

Câmara de Curitiba gastou R$ 20 milhões em matérias pagas

28 out 2011 às 16:01

Os recursos gastos pela Câmara Municipal de Curitiba com a publicação de matérias pagas, entre os anos de 2006 e 2010, totalizaram R$ 19,8 milhões e foram distribuídos entre 302 jornais, rádios, sites e emissoras de TV. A lista dos veículos e o valor total dos gastos no período constam da instrução preliminar concluída esta semana pela Diretoria de Contas Municipais (DCM) do Tribunal de Contas (TC) do Paraná. O documento foi obtido pela assessoria do deputado federal Dr. Rosinha (PT).

Alguns dos veículos de comunicação citados são ligados a vereadores ou a seus parentes, entre eles uma irmã do próprio João Cláudio Derosso (PSDB), presidente do Legislativo. Houve até mesmo casos de pagamentos por aparições de vereadores em colunas sociais. Entre as empresas listadas estão inclusive veículos sediados fora da capital paranaense, em cidades como Colombo, Mandirituba e Almirante Tamandaré.


"Este documento do Tribunal de Contas é mais um importante subsídio para o Conselho de Ética da Câmara. É também um balde de água fria naqueles que tentam absolver Derosso", avalia Dr. Rosinha.


No total, a planilha do TC aponta que a Câmara gastou R$ 34 milhões ao longo de cinco anos de contrato. Desse total, R$ 28 milhões foram repassados à empresa Visão Publicidade Ltda, e outros R$ 6 milhões, à Oficina da Notícia Ltda, de propriedade de Cláudia Queiroz Guedes, esposa do vereador tucano e ex-servidora do Legislativo. As duas empresas foram as únicas que participaram do processo licitatório.


A publicação de matérias pagas, no valor de R$ 19,8 milhões, representou 58,2% dos gastos. Outros 41,3% foram gastos com a suposta impressão do jornal "Câmara em Ação", que custou R$ 14 milhões.


O documento da DCM conclui pela necessidade de instauração de um processo de tomada de contas extraordinária para, entre outras coisas, registrar as irregularidades, apurar os danos ao erário e os respectivos responsáveis.


Os eventuais culpados estarão sujeitos à devolução de recursos ao erário, multa sobre o dano e desaprovação de contas, o que implicaria em inelegibilidade.



Mais de R$ 62,6 milhões


Conforme o documento elaborado pelos técnicos do TC, a agência Visão Publicidade presta serviços à Câmara de Curitiba ao menos desde 1998 – um ano antes, em 1997,
Derosso assumia o primeiro de seus até hoje oito mandatos à frente da presidência da Casa. Como na época ainda não existia o Sistema de Informações Municipais do tribunal, nem o próprio TC sabe informar ao certo qual o valor recebido pela empresa naquele primeiro contrato assinado por Derosso.


Já entre 2002 e 2006, através de um segundo contrato, após vencer uma nova licitação, a mesma Visão Publicidade recebeu repasses que totalizam R$ 20 milhões, de acordo com a instrução da DCM. Entre os meses de março e junho de 2006, a empresa ainda seria contratada sem licitação, e receberia mais R$ 656,6 mil.


De 2002 a 2010, portanto, a Câmara de Curitiba gastou ao menos R$ 54,7 milhões em contratos de propaganda, em valores não atualizados. Somando-se os R$ 7,9 milhões gastos nos anos de 1999 e 2000 – valores obtidos por Dr. Rosinha em consulta ao arquivo do mandato do ex-vereador petista Adenival Gomes–, chega-se a um valor parcial de R$ 62,6 milhões, também sem atualização.



Promoção pessoal


De acordo com a instrução do TC, as amostras de notícias encaminhadas pela Câmara apontam que o parágrafo primeiro do artigo 37 da Constituição Federal foi "claramente ofendido". O dispositivo estabelece que a publicidade dos órgãos públicos deve "ter caráter educativo, informativo ou de orientação social, dela não podendo constar nomes, símbolos ou imagens que caracterizem promoção pessoal de autoridades ou servidores públicos".


Os técnicos do tribunal apontam que o conteúdo das amostras está voltado a promover o trabalho de determinados vereadores. "Aliás, é emblemático que a amostra trazida aos autos pela Câmara contenha, inclusive, notícias pagas sobre a Câmara e seus vereadores em colunas sociais", diz trecho da instrução. "Nota-se que o caráter da publicidade da Câmara quase nada teve de "educativo, informativo ou de orientação social", e que na publicidade constaram claramente "nomes e imagens que caracterizam promoção pessoal de autoridades."


Além da lesão ao patrimônio público, o documento aponta ofensa à ordem democrática e à isonomia nas eleições. E recomenda a instauração de procedimento voltado a avaliar a publicidade de outros órgãos públicos do Estado.


Além de sugerir a inconstitucionalidade dos gastos da Câmara de Curitiba, o documento do TC discute a própria necessidade de a Câmara contratar agência de propaganda para sua publicidade.



Jornal "Câmara em Ação"


A respeito do jornal "Câmara em Ação", que supostamente teve mais de oito milhões de exemplares, mas jamais foi visto inclusive pelos próprios vereadores, o TC afirma que a inspeção deverá verificar a efetiva impressão e distribuição dos exemplares.


"O elevado número de exemplares do informativo impresso deveria acarretar na difusão da publicação à boa parte da população, mas, aparentemente, não foi isso o que ocorreu, pois o jornal é pouquíssimo conhecido", diz o relatório do tribunal.


Os gráficos do custo e da suposta, que variavam muito mês a mês, levou os técnicos do TC a cogitar que o informativo, além de não ser objeto de prévio estudo e planejamento, destinava-se mais a justificar o desembolso de recursos pela Câmara do que a efetivamente comunicar ações da entidade à população.


"Aliás, um trecho do último ofício encaminhado a esta Corte pela Câmara parece corroborar esta conclusão, pois nele a entidade afirma que as impressões do informativo ‘eram variáveis em função dos recursos financeiros mensais’", anotam os técnicos.

Há ainda elementos, conforme o parecer, que apontam que o papel da agência era apenas o de receber o exemplar do informativo dos jornalistas da Câmara e encaminhá-lo à impressão nas gráficas contratadas.


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