O presidente eleito, Jair Bolsonaro, adotou um discurso contraditório a respeito da reforma da Previdência. No final da semana em que se discutiu possível apoio do futuro presidente a mudanças no sistema de aposentadorias ainda neste ano, ele disparou, ao mesmo tempo, frases de quem é contra alterar a Previdência e também daqueles que defendem a necessidade de um ajuste nessa área.
Em transmissão ao vivo pelas redes sociais, Bolsonaro argumentou que o Brasil está chegando ao limite, em referência à situação das contas públicas e disse: "Todos têm que entender que tá complicado a questão da Previdência".
Instantes depois de sinalizar essa percepção em favor da reforma da Previdência, proferiu uma frase comum àqueles que combatem mudança nas aposentadorias e pensões.
"Não podemos falar em salvar o Brasil quebrando o trabalhador", disse, após mencionar eventuais mudanças para o INSS e os servidores públicos.
Bolsonaro disse que não é autor de propostas de alteração na Previdência que preveem o aumento na contribuição.
Também não demonstrou, ao menos de forma pública, apoio a propostas do Congresso que chegaram até a sua equipe econômica.
"O que a gente pode aproveitar ali para o ano que vem, pelo que estou vendo, pouca coisa pode ser aproveitada", disse, em referência às sugestões que recebeu em Brasília.
Com a dificuldadede aprovar uma mudança na Constituição ainda neste ano -que exige mais tempo e mais votos- aliados levaram até ele propostas de alterações que podem ser feitas por meio de projetos de lei mais simples.
O material, elaborado por técnicos do Congresso, sugere, entre outros pontos, o aumento da alíquota de contribuição de servidores para até 22% e mudança na regra de cálculo dos benefícios do INSS que exige 40 anos para ter acesso ao valor máximo da aposentadoria.
Ao mencionar a proposta que exige quatro décadas para receber o valor completo do benefício, Bolsonaro disse: "Eu não tenho nada a ver com isso".
Se o governo promover uma reforma infraconstitucional, os trabalhadores da iniciativa privada provavelmente serão mais afetados que os servidores públicos.
Isso porque, sem mudar a Constituição, a maior parte das alterações possíveis de serem implementadas atinge as regras dos trabalhadores vinculados ao INSS.
Para os funcionários públicos, o ponto mais significativo que poderia ser alterado por meio de lei ou medida provisória é a contribuição previdenciária, hoje em 11%.
Embora a aprovação de uma medida nesse sentido seja considerada uma boa sinalização para o mercado, vai de encontro ao discurso de que é necessário acabar com privilégios -adotado tanto por Temer quanto por Bolsonaro.
Enquanto uma mudança na Constituição exige o voto de 3/5 dos parlamentares, em dois turnos de votação, a aprovação de um projeto de lei ou de medida provisória precisa de maioria simples.
Além do discurso de Bolsonaro com sinais trocados, importantes aliados do presidente já se posicionaram contra reformas, especialmente para o funcionalismo público. Como deputado federal, Major Olímpio (PSL-SP) se opôs de maneira ferrenha às mudanças para servidores proposta de Temer, enviada no fim de 2016.
Responsável pela articulação política, Onyx Lorenzoni (DEM-RS) já classificou o projeto de Temer de "porcaria"edesconfiou da existência do deficit previdenciário.