Dois motoristas do Instituto Médico-Legal (IML) do Paraná confessaram para a polícia que receberam propina de R$ 700 a R$ 1 mil para repassar informações privilegiadas para uma quadrilha suspeita de aplicar golpes para obter o seguro DPVAT (Danos Pessoais Causados por Veículos Automotores de Vias Terrestres) e driblar o rodízio de empresas funerárias em Curitiba.
Doze pessoas desta quadrilha foram presas na última terça-feira (26) durante a "Operação Ressurreição", deflagrada pelo Núcleo de Repressão a Crimes Econômicos (Nurce), que investigou a fraude.
Em depoimento, os servidores públicos disseram que repassavam informações sobre a localização e o contato de familiares de pessoas mortas vítimas de acidentes de trânsito ou morte natural para os integrantes da organização criminosa. Em troca, recebiam dinheiro. A confirmação foi feita por um motorista do IML de Curitiba e outro de Ponta Grossa.
O delegado-titular do Nurce, Renato Figueroa, afirmou que os líderes da quadrilha confirmaram em depoimento que pagaram propina para servidores públicos em troca de informações privilegiadas. O pagamento era feito mediante o sucesso do golpe aplicado nos familiares dos mortos.
"Entre os documentos apreendidos na operação estão comprovantes bancários que revelam transferências de dinheiro feitas pela quadrilha para as contas de parentes dos motoristas do IML", revelou o delegado do Nurce. "Estas pessoas poderão responder pelo crime de lavagem de dinheiro", completou.
Apesar de os envolvidos terem colaborado com a investigação, a Justiça prorrogou por mais cinco dias a prisão temporária de quatro dos 12 presos: Márcio Clovis Baldi da Silva, Tiago Alcaide Ferreira e Luciano Alis Ferreira, apontados como líderes desta quadrilha, e também a de Gustavo Mello da Silva, filho de Márcio. Eles ficarão detidos, a princípio, por mais cinco dias.
Figueroa afirmou que a renovação da prisão temporária dos quatro é necessária para desvendar a atuação da quadrilha. "Ouvimos todos os envolvidos e percebemos algumas contradições. O juiz determinou a prorrogação da prisão deles, o que vai nos permitir fazer acareações", explicou. Os outros presos serão soltos neste sábado (30), quando vence a prisão temporária. "Os demais presos colaboraram com as investigações e não tinha motivo para mantê-los preso", completou o delegado do Nurce.
O esquema
Durante as investigações, os policiais descobriram que os integrantes desta quadrilha passavam o dia e especialmente a madrugada atrás de corpos de vítimas de acidentes de trânsito ou morte natural, sendo que para isso corrompiam os motoristas do IML, para que estes passassem informações privilegiadas e em tempo real dos óbitos ocorridos na capital, região metropolitana e em Ponta Grossa.
De posse das informações do morto, os integrantes da quadrilha faziam contato com os familiares para obter deles procurações para dar entrada no seguro DPVAT – cujo valor pode chegar até R$ 13,5 mil. Uma pequena parte deste dinheiro era repassada à família dos mortos e o restante ficava com a organização criminosa. A alegação era de que o restante era gasto nas despesas do enterro.
Durante a operação, os policiais do Nurce prenderam donos de funerárias, motoristas do IML e de empresários. As pessoas detidas serão indiciadas pelos crimes de associação criminosa, corrupção ativa, corrupção passiva, estelionato e falsidade ideológica.
Um dos documentos falsificados foi um boletim de ocorrência no qual um dos suspeitos, Luciano Alis Ferreira, tentou fraudar a morte do próprio pai, Luiz Gonzaga Ferreira. Luciano chegou a fazer um Boletim de Ocorrência no dia 25 de fevereiro de 2015 comunicando a morte do pai vítima de atropelamento. Para a surpresa dos investigadores, o "morto" apareceu em uma das conversas interceptadas autorizadas pela Justiça.
Investigação
O trabalho da polícia começou em julho de 2015 após representantes do IML comunicaram irregularidades na liberação dos corpos de duas pessoas. No caso de Silmara de Campos Ferreira os registros sobre o óbito teriam desaparecido do Instituto, sendo ela enterrada no município da Lapa, através do esquema realizado pela quadrilha.
Outro caso envolve Humberto Guimarães da Silva, declarado morto pelo próprio filho que foi induzido pelos golpistas. O crime não se consumou porque a seguradora desconfiou das informações repassadas.