Quatro presos foram encontrados mortos em menos de um mês em celas de delegacias e penitenciárias do Paraná. Os casos expõem um problema relatado constantemente à Comissão de Direitos Humanos e Cidadania da Assembleia Legislativa do Paraná (Alep): a falta de segurança nas unidades prisionais do Estado.
Dentre os casos registrados recentemente, dois ocorreram dentro de delegacias. O primeiro aconteceu em Apucarana. José Adriano Silva Neto, de 23 anos e Fabiano Lino, 22, ambos acusados de terem matado uma jovem grávida foram encontrados mortos no dia 19 de setembro em um anexo à delegacia da 17ª SDP.
Já a morte mais recente aconteceu em Rio Negro em 4 de outubro. Na ocasião, José Ademir Rodol, suspeito de assassinar uma jovem de 18 anos, filha da sua namorada, também foi encontrado morto dentro de uma cela.
Em ambos os casos a Polícia Civil trabalha com a suspeita de suicídio, hipótese vista como "fantasiosa" para o deputado estadual e presidente da Comissão de Direitos Humanos da Alep, Tadeu Veneri (PT). "Não acredito que depois de terem cometido um crime tão grave eles tenham a capacidade de dar cabo à própria vida, isso sem que ninguém perceba e interfira".
Para o deputado, o Estado precisa assumir sua responsabilidade diante dos casos. "Quando uma pessoa é presa ela perde a sua liberdade. Então é compromisso do Estado garantir a sua segurança".
De acordo com a assessoria de imprensa da Polícia Civil, inquéritos foram abertos pelas próprias delegacias para investigar os casos. Ainda de acordo com a assessoria, somente em situações de denúncia ou suspeita de envolvimento de agentes nas mortes as investigações são repassadas para a Corregedoria da Polícia, um órgão independente.
No caso de Apucarana, os dois presos mortos ocupavam uma cela de segurança separada dos demais detentos. Já no caso de Rio Negro, o detento dividia uma cela com mais três pessoas, que também precisavam ficar separadas dos demais. A assessoria da Polícia Civil informou que a recomendação que se dá às delegacias é de que mantenha os detentos que correm riscos em celas individuais. Porém, afirmou que a superlotação, tanto das delegacias, quanto das unidades prisionais impedem, na maioria das vezes, que isso ocorra.
Para a Polícia, o ideal é que os presos passem o menor tempo possível nas delegacias e sejam encaminhados rapidamente para as prisões.
Tadeu Veneri concorda com a posição. "Lugar de preso não é na delegacia". Mas, segundo ele, o fato não abre espaço para que as autoridades abram mão de garantir a integridade dos detentos. "Quando alguém é preso pela Polícia Militar, os policiais da viatura respondem pela segurança. Na delegacia é a mesma coisa, o delegado é o responsável pela segurança".
A violência contra presos ainda no momento da triagem preocupa a Comissão de Direitos Humanos. Um exemplo da fragilidade da segurança nas delegacias, conforme Veneri, é o Caso Tayná. Na ocasião, quatro homens foram presos acusados de terem matado e violentado a garota de 14 anos, mas a denúncia contra eles não se confirmou. O corpo da adolescente foi encontrado em um terreno em Colombo.
O Ministério Público passou a investigar o caso após a suspeita de que os quatro suspeitos teriam sido torturados para confessarem o assassinato. O crime sofreu uma reviravolta. Os quatro foram soltos e os policiais e funcionários da delegacia foram presos.
"Não tenho dúvidas de que esses quatro teriam sido colocados na prisão e seriam mortos. O inquérito ia ser encerrado e o caso ia ficar por isso", comentou o deputado.
Problema sem solução
Veneri disse que a violência nas cadeias é um problema ainda sem solução. O deputado argumentou que as condenações no Brasil não servem para reinserir o preso de volta à sociedade. "No Brasil a pessoa é condenada como forma de vingança, como se isso fosse reverter o crime cometido por ela". O presidente da comissão destacou que é inadmissível que ainda existam casos de violência dentro das celas. "Em nenhum Código Penal está previsto que o detento tem que sofrer tortura, tem que ser espancado, tem que ser humilhado. A única condenação que ele pode sofrer é a perda da liberdade".
O deputado aproveitou para cobrar mais transparência do Estado. Veneri comentou que as investigações relacionadas às polícias quase nunca tem resultado divulgado. "A polícia até abre processos de investigação, mas não tem publicidade nenhuma. Até sabemos de casos de policiais que são afastados, mas poucos meses depois eles estão nas ruas de volta".
O fato, segundo Veneri, cria um clima de medo na população. "A pessoa faz uma denúncia e depois disso ela começa a ser ameaçada. Isso faz com que o fato fique por isso, não vai para frente".
Penitenciárias
O deputado vê um alento, quando os casos são de competência da Secretaria Estadual da Justiça e Direitos Humanos (Seju). Um exemplo é a morte de um preso na Penitenciária Estadual de Londrina (PEL I). João Maria de Paula foi encontrado morto no último dia 21 de setembro. A secretaria abriu uma sindicância para apurar o fato. A suspeita inicial é de que o detento sofreu uma overdose.
Em entrevista ao Portal Bonde, Ribeiro comentou sobre a existência de relatos de agressões nas unidades prisionais administradas pelo Estado. Ribeiro disse que "a secretaria não tolera de forma alguma casos de violência".
"É inadmissível qualquer ato de agressão dentro das penitenciárias. A secretaria acompanha com cautela todas as situações e quando existe algum indício a punição é rigorosa".
Conforme dados repassados ao Bonde, a Seju já abriu 647 processos administrativos disciplinares e sindicâncias para apurar a conduta dos agentes penitenciários, sendo que 281 processos ainda estão em andamento. Conforme a secretaria, 81 procedimentos resultaram em punições: foram quatro advertências, 30 repreensões, 31 suspensões e 16 agentes já foram demitidos. O número de demissões de servidores que ainda precisam ser publicadas no Diário Oficial do Estado não foi informado.
As demissões são motivadas fundamentalmente por duas situações: facilitação comprovada de entrada de armas e drogas no estabelecimento penal e falsificação reiterada de documentos, especialmente de atestado médico, por falta ao trabalho. As demais penas aplicadas envolvem também outros problemas, como agressão a presos e outros desvios de conduta.
O caso mais grave de agressão contra preso registrado pela Seju nos últimos anos ocorreu em fevereiro de 2013. Marcos Souza de Melo, 37, foi morto dentro de uma cela na Casa de Custódia de Maringá. Ele morreu por conta de insuficiência respiratória, trauma torácico e abdominal, e hemorragia aguda. Os ferimentos levantaram suspeita, já que o homem estava isolado na cela.
Tão logo surgiu o indício de violência praticado por agentes, os responsáveis pelo caso foram suspensos pela secretaria. Conforme o corregedor, "os agentes estão sendo processados tanto criminalmente quanto administrativamente".