A Procuradoria da República de Foz do Iguaçu já identificou cerca de 3 mil pessoas envolvidas em remessa de dinheiro ilegal ao exterior. A evasão de divisas, segundo representantes do Ministério Público Federal (MPF), já ultrapassou os US$ 4 bilhões (cerca de R$ 11 bilhões) em cinco anos, somente na fronteira Brasil-Paraguai.
Os procuradores da República em Foz, Mark Torronteguy Weber e Jessé Ambrósio dos Santos Júnior, esperam instaurar até o ano que vem pelo menos mil inquéritos. Nesta quinta-feira, os representantes do MP divulgaram duas denúncias acatadas esta semana pelo juiz Federal da 1ª Vara Criminal de Foz, Edilberto Barbosa Clementino. As denúncias, que tratam da evasão de quase R$ 6,3 milhões durante o ano de 1997, serão unificadas em apenas um processo.
Foram indiciados 19 pessoas, entre "laranjas", funcionários dos bancos Banestado e Araucária, e ainda da empresa paraguaia Real Câmbio S.R.L. e da brasileira Elcatur Câmbio e Turismo. "Contatamos a existência de uma verdadeira organização criminosa. Eram pessoas ligadas a casas de câmbio que agenciavam laranjas e falsificavam documentos para evitar a identificação das pessoas que realmente enviavam o dinheiro ao exterior", explicou Weber.
O MP identificou sete depositantes. Eles estariam mantendo a conta do mecânico (e "laranja") Nelson Zang, de 36 anos, aberta no Banestado. Em seguida, o dinheiro seria repassado em cheques de pequeno valor, depositados na conta CC5 da Real Câmbio, mantida no Banco Araucária. A "lavagem" era concretizada com os créditos repassados à outra conta CC5, aberta no Banco Integracion do Paraguai.
Investigações comprovaram que as três contas pertenciam apenas à empresa Real Câmbio, que mantinha Zang e outros três funcionários como "titulares de fachada". Para Santos Junior, o processo é apenas a ponta de um iceberg. Ele admitiu que as investigações têm sido lentas e justificou a demora do processo pela falta de profissionais.
Em todo o Brasil, existem pouco mais de 300 procuradores da República (um para cada quatro juízes). "Em Foz, somos em apenas três representantes do MP, três juízes e quatro delegados trabalhando nesse e em outros 300 inquéritos. Estamos investigando 3 mil pessoas supostamente envolvidas em transações ilegais na fronteira que somam US$ 4 milhões", explicou o procurador, usando informações levantadas pelo MP e Banco Central.
Mesmo apresentando números locais, os procuradores não quiseram comentar sobre outros processos e investigações mantidos pelo órgão federal. Além de acatar as denúncias, decretar a indisponibilidade dos bens dos denunciados (excetto de Lang) e pedir a quebra do sigilo fiscal dos envolvidos, o juiz Clementino determinou a prisão preventiva de cinco pessoas (o restante estaria colaborando com as investigações).
O juiz também agendou novos interrogatórios, que terão início no dia 6 do mês que vem. Nenhum envolvido foi preso, mas todos deverão responder a processo por formação de quadrilha, sonegação fiscal e evasão de divisas. Somente para o último crime, a pena é de dois a seis anos de prisão.
O esquema
- A conta "laranja" nº 010122-1 foi aberta no Banestado de Foz, em nome de Nelson Zang, no dia 26 de agosto de 1997. A conta era acompanhada pelo gerente Vanderi Werle
- Entre 26 de agosto e 10 de outubro de 1997, foram registrados vários depósitos na conta de Zang, em nome de diversas pessoas físicas. O MP identificou sete dos depositantes
- A conta pertencia a Elcatur Câmbio e Turismo, cujos sócios seriam Deborah Ormay Molas e os paraguaios Oscar Albino Garcete Pacheco e Victor Hugo Samaniego Escobar. Na verdade, segundo investigações dos procuradores, os três seriam funcionários da Real Câmbio
- O dinheiro depositado no Banestado era repassado à conta nº 45005-5 do Banco Araucária, pertencente à Real Câmbio S.R.L. Integram a diretoria da Real os sócios Mariano Zubledio Chaparro, Juan Carlos Baruja Saldivar e Mário Alcides Toppi Ortigoza, todos paraguaios. O gerente da agência de câmbio era Valdir Werle, irmão de Vanderi Werle
- Entre 4 de setembro e 10 de outubro de 1997, foram registrados 84 depósitos em cheques do Banestado na conta do Banco Araucária. Muitas folhas foram debitadas em sequência (em oito dias, foram depositados os cheques entre os números 863.301 e 863.320)
- Em apenas 36 dias, foram movimentados o equivalente a US$ 2,31 milhões (outros US$ 130 mil estão sendo investigados em outros diferentes). O MP responsabilizou o presidente do banco, Alberto Delcanale Neto, e os funcionários Milton Bezerra Leite (gerente) e Ruth Whaterly Bandeira (diretora de câmbio) pelas irregularidades. Todos moram em Curitiba
- Os depósitos eram repassados para a conta CC5 nº 045000-6 do Banco Integracion do Paraguai, aberta dentro do próprio Araucária. Remetido ao país vizinho, o dinheiro seria convertido em moeda local a título de "liquidação de operações de câmbio", efetivando o crime de evasão de divisas