Paraná

Falsa profecia

25 set 2001 às 18:17
As Profecias Completas e O Pequeno Livro de Nostradamus se tornaram best-sellers no site de comércio eletrônico Amazon.com logo depois dos ataques terroristas ocorridos nos Estados Unidos em 11 de setembro. Nos buscadores, as palavras mais procuradas desde que aconteceram os atentados não foram World Trade Center nem Osama Bin Laden, mas sim Nostradamus.
Em meio à crise, as consultas via Internet e as preocupações de grande parte da população nos Estados Unidos se relacionam aos textos escritos por um profeta que viveu no século XVI. O interesse supera até o profundo nacionalismo que o terrorismo fortaleceu nos norte-americanos. A "bandeira americana" ficou em um modesto décimo segundo lugar no ranking de palavras-chaves procurada no Wordspot.com durante a semana dos ataques.
Depois do tumulto causado pelos últimos acontecimentos, muita gente procurou algum tipo de consolo e explicação, outros se interessaram por informações relacionadas aos supostos responsáveis pelos atentados, e houve quem buscasse alguma "prova" de que os atentados poderiam ter sido evitados ou previstos. Além de deixar um grande número de mortos, os ataques ao World Trade Center e ao Pentágono abalaram a sensação de invulnerabilidade dos Estados Unidos. Para alguns, essa sensação foi irritante, mas necessária. A ingenuidade de uma criança foi substituída (a um preço muito alto) pela visão de um adulto, uma visão de mundo mais clara, mais realista e, às vezes, mais pessimista. Para outros, marcou o início do fim, porque comparam a ilusão de segurança ao sentimento de que o mundo está prestes a acabar. Este medo encontrou eco numa suposta profecia de Nostradamus que começou a circular pela Internet antes mesmo de a poeira baixar no sul de Manhattan.
Na cidade de Deus haverá um grande trovão,
Dois irmãos partidos ao meio pelo caos,
Enquanto a fortaleza agüenta, o grande líder sucumbirá.
A grande guerra começará quando a grande cidade estiver em chamas.
Nostradamus, 1654
Esta é apenas uma das traduções que circulou pela rede de textos atribuídos ao físico e astrólogo francês Michel de Nostradamus (1503-1566). Uma simples conta prova que a profecia não foi feita por Nostradamus, que morreu 88 anos antes da data em que o texto teria sido escrito.
Esse texto apareceu pela primeira vez em uma página da Internet criada por um estudante da Brock University, no Canadá, nos anos 90, em um ensaio sobre Nostradamus. O autor, Neil Marshall, criou estas quatro frases justamente para mostrar como é fácil, usando imagens abstratas, inventar uma profecia que pareça real.
Certamente alguém achou que o exemplo era uma profecia real e mandou a primeira mensagem por e-mail. E, como acontece com várias outras mentiras ("hoaxes") que circulam pela rede, a mensagem começou a se espalhar e ao mesmo tempo a se modificar. Algumas pessoas decidiram acrescentar outro quarteto ao primeiro texto, fazendo uma alusão a "pássaros de aço que se enterravam em candelabros", para que ficasse ainda mais parecido com o que aconteceu em Nova York.
Um filósofo pós-moderno diria que estas buscas na Internet revelam muito sobre a cultura do mundo ocidental e a busca de um significado oculto por trás da violência e do sofrimento. A questão seria que as pessoas não suportam a incerteza e, quando a ciência e a religião não oferecem as respostas às suas dúvidas, elas procurarão obter explicações em outras fontes. Mas as estatísticas são um pouco enganosas. Nem todo mundo que procura informação sobre profecias acredita nelas. Ou não mais do que em um horóscopo. Além disso, os números não dizem muito sobre os padrões de busca de um usuário típico. Provavelmente poucos tiveram que ir a buscadores para encontrar notícias sobre os atentados, porque muitos usaram bookmarks nos sites que costumam visitar, ou digitaram a URL desses sites. O fato de que muita gente tenha tido de buscar "Nostradamus" na verdade mostra que a maioria dos usuários não tem os sites das profecias entre seus "favoritos". E isso é uma boa notícia.

Continue lendo