Em vigília realizada durante a última reunião de 2006 da Comissão Técnica Nacional de Biossegurança (CTNBio), em Brasília, a Via Campesina e integrantes da campanha "Por Um Brasil Livre de Transgênicos" conseguiram evitar a liberação comercial de qualquer novo cultivo de organismo geneticamente modificado no país e também fazer com que fosse aceita a realização de uma audiência pública para discutir o milho transgênico.
A CTNBio estava reunida desde terça-feira (12) para discutir a liberação de dois tipos de milho transgênico: um da Monsanto (o Guardian Bt) e outro da Bayer (Liberty Link). O pedido da Bayer, no entanto, segundo o Greenpeace, não poderia ser votado porque a Justiça do Paraná determinou, em 5 de dezembro, a suspensão de qualquer decisão sobre a liberação comercial deste milho, até que fosse realizada uma audiência pública para discutir o processo.
A Constituição Federal garante a realização de audiência pública sobre assuntos de interesse público, mas a CTNBio negou o pedido feito em outubro por diversas entidades.
"O que ocorreu esta semana foi uma boa lição para os membros da CTNBio, porque eles tiveram que voltar atrás em relação à audiência pública, conforme exigiu a liminar da Justiça do Paraná", afirmou Maria Rita Reis, advogada da ONG Terra de Direitos que participou da vigília na sede da Comissão em Brasília por dois dias.
O gol marcado pelos ambientalistas, trabalhadores rurais, cooperativas e demais entidades não nasceu de um lance isolado. Há tempos que a jogada vem sendo trabalhada para pressionar tanto empresas de biotecnologia como a CTNBio a não transformar o Brasil em uma nova fronteira transgênica no planeta.
Em novembro, por exemplo, o Greenpeace realizou um protesto pacífico na sede da Bayer CropScience, em São Paulo, com ativistas cercando o prédio com faixas e exigindo que a empresa se posicionasse sobre as evidências de que o milho Liberty Link oferece risco de contaminação a culturas convencionais e pode representar riscos à saúde humana.
O jogo se desenrolou também em outro campo, mais complexo - a Câmara dos Deputados - mas nem por isso menos emocionante. A grande preocupação das organizações da sociedade civil era em relação à Medida Provisória 327, que originalmente tratava da redução da distância entre plantios transgênicos e unidades de conservação. Com a apresentação de 19 emendas, a MP foi desvirtuada e passou a tratar de tudo um pouco em relação aos organismos geneticamente modificados.
Uma audiência com o relator da MP, deputado Paulo Pimenta (PT-RS), foi requisitada dia 11 de dezembro, para discuti-la, mas não houve resposta. No dia seguinte, o relator apresentou seu parecer e nele aconselhou a aprovação da MP, além de acatar duas das emendas - uma que altera o quorum necessário para aprovações na CTNBio e outra que autoriza a utilização de algodão transgênico da Monsanto plantado ilegalmente no país. O parecer foi colocado em votação mas, como não houve acordo de lideranças, a medida foi retirada de pauta. Bola na trave do adversário!
A MP voltou à pauta no dia seguinte, mas novamente retirada. De acordo com o Greenpeace, ficou claro, no entanto, que a bancada ruralista tenta votar a MP o mais rápido possível e que o PT precisa resolver se vai ficar ao lado de seus aliados históricos e da sociedade brasileira ou vai deixar a sensação de que pode estar se tornando o "Partido dos Transgênicos".
A vitória, por enquanto, é parcial e nossa, diz o Greenpeace. "Mas o jogo não terminou. Semana que vem existe a possibilidade da MP ser votada na Câmara. Nossos parlamentares terão que decidir se votarão em nome de mais de 70% dos brasileiros, que rejeitam os transgênicos, ou a favor dos ruralistas e da indústria de biotecnologia", afirma Gabriela Vuolo, coordenadora da campanha de engenharia genética do Greenpeace Brasil. (AEN)