A Corte Suprema de Justiça da Argentina, equivalente ao Supremo Tribunal Federal (STF) do Brasil, emitiu nesta terça-feira por unanimidade um parecer que autoriza o aborto em casos de gravidez resultante de estupro, sem a necessidade de autorização prévia da Justiça. A sentença também foi favorável à descriminalização do aborto para a mulher e o médico que realizar a intervenção cirúrgica. A decisão da máxima instância judicial da Argentina deverá formar jurisprudência e terminar com diferentes interpretações do Código Penal, as quais têm dificultado o acesso ao procedimento de várias vítimas de estupro na Argentina.
A sentença será emitida em um processo envolvendo uma adolescente de 15 anos, que foi estuprada e engravidada por seu padrasto, um oficial da polícia da província de Chubut. Em 2010, a adolescente solicitou à Justiça a autorização para realizar o aborto, mas o pedido foi negado por juízes de primeira e segunda instância. Quando a garota já estava com 20 semanas de gestação, um tribunal terminou concedendo a autorização legal para o aborto, sem consequências penais nem para ela, nem para o médico.
Agora, a Suprema Corte confirmou a decisão, que deve colocar um ponto final a uma série de interpretações confusas do artigo 86 do Código Penal argentino, o qual reza sobre os casos em que o aborto é permitido. A lei atual deixa dúvidas sobre se a descriminalização do aborto é permitida para todas as mulheres estupradas ou somente para a mulher portadora de deficiência física e mental. Nos últimos anos, muitos juízes negaram a autorização legal para a realização de abortos em mulheres adolescentes e adultas, inclusive portadoras de deficiências, por falhas na interpretação da Lei.
Médicos de hospitais públicos também têm se negado a realizar o procedimento por temor à penalização. A sentença da Suprema Corte pretende esclarecer os pontos que geram dúvidas na lei e garantir o aborto gratuito nos hospitais públicos e livre de penas para toda mulher, cuja gravidez é resultado de estupro, e para todos os médicos que realizam o procedimento. A lei argentina disse que o aborto não deve ser punido nos casos em que "a gravidez representar um risco de vida ou à saúde da mulher" e quando "a gravidez for proveniente de uma violação ou atentado contra o pudor cometido sobre uma mulher idiota ou demente".
A decisão da Suprema Corte argentina argumenta que submeter a mulher violada a ter que pedir autorização de um juiz porque o médico do hospital, onde compareceu para pedir ajuda, se negou a praticar a intervenção, é equivalente a obrigá-la a suportar uma exigência adicional desnecessária, porque a lei já autoriza o aborto nesse caso. A partir do parecer da Suprema Corte, a vitima deverá apresentar ao hospital somente a denúncia policial registrando o estupro e não será obrigada a recorrer à Justiça para obter autorização de um juiz.