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Airbus tem 'armadilha mortal', diz especialista da Iasa

06 ago 2007 às 17:36

O diretor de engenharia e operações técnicas da Associação Internacional de Segurança Aérea (Iasa, na sigla em inglês), John Sampson, disse à BBC Brasil que o sistema de reverso do Airbus 320 tem "uma armadilha mortal".
Sampson critica o fato de que uma falha de equipamento ou um erro no posicionamento do manete de uma das turbinas, na hora do pouso, desative o sistema de frenagem automática da aeronave.

A Iasa é uma organização internacional sem fins lucrativos que investiga acidentes e elabora análises sobre a segurança na aviação.


No dia 17 de julho, um Airbus 320 da TAM não conseguiu parar após a aterrissagem no aeroporto de Congonhas, atravessou a avenida Washington Luis e se chocou com o prédio em frente ao aeroporto, deixando 199 mortos.


Na semana passada, após análises das caixas-pretas do vôo, a Airbus divulgou uma nota afirmando que não houve "defeito de funcionamento" na sua aeronave.


Posição neutra- No momento da aterrissagem, a Airbus determina que os manetes de ambas turbinas devem ser colocados em ponto morto (posição neutra do manete) e, em seguida, levados à posição de reverso, que inverte o fluxo de ar nas turbinas e ajuda a parar a aeronave.


O procedimento é sempre igual, mesmo que um dos reversos esteja travado, como era o caso do avião da TAM.


"(O problema é que) se um dos manetes ficar para cima (ou seja, na posição de aceleração), os spoilers não são acionados, os freios automáticos não operam e a turbina (com o manete na posição de aceleração) começa a ganhar potência, porque o acelerador automático é acionado após o avião tocar o chão. Tudo isso acontece, mesmo se o outro manete está na posição correta de reverso", disse Sampson, em entrevista à BBC Brasil.


Os dados da caixa-preta do vôo 3054 da TAM sugerem que foi isso que aconteceu em São Paulo.


Segundo os registros, um dos manetes teria ficado na posição de aceleração enquanto o outro estaria na posição de desaceleração.


Existe a possibilidade também de que os pilotos tenham fisicamente colocado ambos os manetes na posição de desaceleração, mas que uma falha mecânica ou eletrônica tenha feito com que o computador "entendesse" que um deles ficou na posição acelerada.


Com isso, o único sistema que continuou à disposição dos pilotos para parar o avião foram os freios hidráulicos, que controlam o trem-de-pouso, e uma das turbinas – a que tinha o reverso funcionando. A outra turbina continuou acelerando.


Para Sampson, o fato de que o sistema possa gerar uma situação como essa deveria pôr em questão "a validade da Lista Mestra de Equipamentos Mínimos do A320", em que se afirma que o Airbus pode funcionar com um reverso inoperante.


Mudanças na operação - Procurada pela BBC Brasil, a Airbus na França disse que não fará novos pronunciamentos sobre os sistemas do A320 e o acidente no Brasil antes que as investigações sejam concluídas.


Sobre a avaliação que Sampson faz, a companhia disse que "a aeronave e seus sistemas foram avaliados por autoridades internacionais de certificação, particularmente pela européia Joint Aviation Authority e a Federal Aviation Administration americana, que especificam os critérios de segurança aos quais uma aeronave deve responder".


"Qualquer indivíduo pode ter sua própria opinião, mas nós devemos nos submeter aos requerimentos das autoridades de certificação", acrescentou a Airbus.


Outro ponto criticado pelo engenheiro da Iasa é a própria operação dos manetes quando um reverso está inoperante. Desde o lançamento do A320, há praticamente duas décadas, pelo menos duas mudanças já foram feitas na operação por causa de acidentes.


Uma das mudanças foi ampliar os sistemas sonoros que alertam os pilotos quando os manetes estão em posição errada.


Essa foi a causa apontada nos acidentes com um A320 da Philippine Airlines em 1998, que matou três pessoas em terra, e com outro da Transasia Airways em 2004, em Taiwan, que parou ao cair em uma vala, sem causar mortes.


O inquérito sobre o acidente em Taiwan concluiu: "Depois de o avião tocar o solo, os avisos sonoros para retardar cessaram e nada mais recordava os pilotos de que deveriam levar à posição neutra o manete da turbina dois", cujo reverso estava inoperante e, por isso, havia sido esquecido na posição de aceleração.


Após esses acidentes a Airbus recomendou que as companhias instalassem sistemas extras de alerta. No caso do acidente da TAM, a caixa-preta teria registrado dois sinais de alerta para a condição do manete, um pouco antes do avião tocar o solo e outro quando ele já estava na pista.


'Confundir os pilotos' - Os acidentes anteriores também fizeram com que a Airbus mudasse a orientação que dava aos pilotos sobre como atuar no pouso quando um dos reversos não está funcionando.


Até abril de 2006, o manete da turbina com o reverso desativado devia ser deixado na posição neutra, enquanto o da turbina com reverso operante era movido para a posição de desaceleração.


A partir dessa data, a companhia passou a orientar que os dois manetes fossem operados simultaneamente como se não houve nenhum problema no reverso.


Sampson concorda que as mudanças feitas diminuem os riscos de erro do piloto, "porque favorece o movimento espontâneo de puxar os dois manetes ao mesmo tempo", mas insiste que, em situações de estresse, o sistema do A320 "pode confundir os pilotos".


"Quando se está diante de uma pista curta e molhada, em um dia de chuva, a primeira coisa que o piloto pensa é que precisa acionar o reverso bom, já que sabe que isso é fundamental nesse cenário, e porque também sabe que todo o resto é automatizado: spoilers e freios."


Ele argumenta que, mesmo sendo uma operação básica e simples, não é impossível que mesmo pilotos experientes não consigam perceber o que fizeram de errado nos poucos segundos que têm para tomar uma decisão.


No caso da TAM, entre o momento que o avião tocou o solo e a explosão, 25 segundos se passaram.


Em entrevista ao jornal Folha de S. Paulo, o presidente da Infraero, brigadeiro José Carlos Pereira, teria sugerido que há um erro de projeto no Airbus 320.


"Quando você tem um erro de projeto que induz a um erro de piloto e soma a isso um problema de manutenção, tudo fica exatamente como o diabo gosta", disse Pereira, segundo o jornal.

O brigadeiro foi demitido da presidência da Infraero e deixou oficialmente o cargo nesta segunda-feira (06).


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