As buscas pelo termo aumentaram 350% na internet, segundo dados do Google Trends, que reúne os números das expressões mais pesquisadas pelos internautas, após o presidente anunciar em discurso durante as manifestações de 7 de setembro que convocaria uma reunião do “Conselho da República”, um órgão de consulta que se pronuncia sobre estados de exceção e outras questões relevantes para a estabilidade das instituições democráticas.
“Ficamos sabendo que o presidente Jair Messias Bolsonaro resolveu agir e, a partir de agora, o Brasil está em estado de sítio”, brada um dos manifestantes em uma das gravações, com a voz embargada, desculpando-se “pela emoção”. Já em outra, dois supostos caminhoneiros se abraçam dizendo que “fizemos a nossa parte, conseguimos o estado de sítio”. Não se sabe qual foi a origem da falsa informação recebida pelos três, mas não é bem assim que um estado de sítio é decretado.
“Se tivesse mesmo sido decretado, eles talvez nem poderiam estar ali comemorando em grupo, já que um dos dispositivos é a suspensão da liberdade de reunião”, aponta o advogado Felipe Jordão, especialista em Direito Constitucional. Para ele, o episódio mostra como o cidadão, em geral, é desconectado do funcionamento das leis no país. “É mais um efeito adverso dos problemas educacionais e, devido à forte polarização política atual, qualquer um sai repetindo apenas o que lhe interessa em diversos assuntos, desde vacinas até Constituição”, lamenta.
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Mas, afinal, o que é estado de sítio?
O estado de sítio está descrito no artigo 137 da Constituição Federal. O texto diz que o presidente da República pode pedir autorização para decretar estado de sítio em caso de “comoção grave de repercussão nacional ou ocorrência de fatos que comprovem a ineficácia de medida tomada durante o estado de defesa” ou “declaração de estado de guerra ou resposta a agressão armada estrangeira”. É o chamado “sistema constitucional de crise”, que tem por objetivo a defesa do estado e das instituições democráticas.
Ele permite a suspensão de garantias constitucionais por, no máximo, 30 dias, autoriza o governo federal a interceptar comunicações entre cidadãos, controlar a imprensa, proibir reuniões de pessoas e até mesmo prender cidadãos sem necessidade de uma determinação judicial. Com ele em vigor, o Planalto também não precisaria de autorização do Judiciário para realizar operações de busca e apreensão, intervir em empresas particulares ou exigir bens de qualquer pessoa. “O presidente pode até decretar, mas para isso precisa de autorização dos outros poderes. Como primeiro passo, ele deve convocar e ouvir tanto o Conselho da República quanto o Conselho de Defesa Nacional”, explica Jordão.
A criação do Conselho da República foi prevista na Constituição de 1988, no artigo 89, e passou a funcionar em 1990, quando o então presidente da República, Fernando Collor, promulgou a Lei 8.041/90. Atualmente, ele reuniria o vice-presidente, Hamilton Mourão (PRTB), e o ministro da Justiça, Anderson Torres. Pela Câmara dos Deputados, o presidente da Casa, Arthur Lira (PP-AL), o líder da maioria, Diego Andrade (PSD-MG), e o líder da minoria, Marcelo Freixo (PSB-RJ). Por parte do Senado Federal, integram o Conselho o presidente Rodrigo Pacheco (DEM-MG), o líder da maioria, Renan Calheiros (MDB-AL), e o líder da minoria, Jean-Paul Prates (PT-RN).
Há ainda a participação de seis cidadãos brasileiros natos, com mais de 35 anos de idade, sendo dois nomeados pelo presidente da República, dois eleitos pelo Senado Federal e dois eleitos pela Câmara dos Deputados. Atualmente, fazem parte, respectivamente: Augusto Heleno, ministro do Gabinete de Segurança Institucional, e Paulo Skaf, presidente da Fiesp (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo); Cid Marconi, desembargador federal do TRF-5, e Tibério de Melo Cavalcanti, advogado; Eugênio Aragão, ex-ministro da Justiça, e José Carlos Aleluia (DEM-BA), deputado federal. Embora exista há mais de 30 anos, a primeira convocação efetiva do Conselho da República só ocorreu em fevereiro de 2018, durante o mandato do ex-presidente Michel Temer (MDB), para discutir a intervenção federal na segurança pública do estado do Rio de Janeiro.
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