A remuneração média de trabalhadores brancos foi 90,7% maior que a de pretos e pardos em setembro, último dado disponível, aponta estudo do economista Marcelo Paixão baseado na Pesquisa Mensal de Emprego do IBGE, que reúne dados sobre as seis maiores regiões metropolitanas do País. Desde o início da crise econômica global, o auge da desigualdade entre os dois grupos no mercado de trabalho tinha sido registrado em fevereiro, quando a renda dos brancos era 102% superior.
"Acho que qualquer queda de desigualdade é para ser comemorada. O que não se pode é ser exagerado no grau de otimismo, porque não vejo nos indicadores motivos para supor que esse ritmo de redução da desigualdade vá se manter nos próximos meses", diz Paixão, professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro, onde coordena o Laboratório de Análises Econômicas, Sociais e Estatísticas das Relações Raciais (Laeser).
Formado em economia e doutor em sociologia, o professor tem algumas hipóteses para a redução registrada até setembro, um ano após o início da crise (em setembro de 2008, os brancos ganhavam 101% a mais). Uma delas é a retomada de investimentos na construção civil, que recebeu incentivos do governo. A participação dos pretos e pardos no setor é majoritária (59,9%). Outra explicação seria a maior presença deste grupo em setores informais, em tese menos afetados pela crise. Dados da PME mostram que o peso do setor formal era de 65% entre os brancos do sexo masculino, e de 60% entre os pretos e pardos - já entre as mulheres, era de 58% (brancas) e 47% (pretas e pardas).
"No momento em que a crise atingiu o seu momento mais complicado, as desigualdades aumentaram. Ao longo do ano, à medida em que o País foi conseguindo resistir de maneira mais forte do que se supunha, houve um declínio nas desigualdades, que ainda são muito profundas e dificilmente vão ser superadas apenas com medidas de características mais gerais", avalia o professor.
Em setembro deste ano, a maior desigualdade foi registrada na região metropolitana de Salvador, onde a remuneração dos brancos era 136% maior que a de pretos e pardos, seguido por Recife (96,5% maior), Rio (96,1%), Belo Horizonte (95,3%), São Paulo (91,5%) e Porto Alegre (51,9%). No conjunto das seis regiões metropolitanas, a taxa de desemprego das mulheres pretas e pardas foi de 11,2%, mais que o dobro da taxa dos homens brancos (5,3%).
Para Paixão, há "forte persistência da preservação de abismos" no Brasil. "Uma política de expansão do crédito e mais frouxa do ponto de vista fiscal não tem por objetivo combater desigualdades sociais nem raciais", diz ele. "Elas podem até ter esse efeito indireto, mas o ideal seria que fossem combinadas com ações afirmativas e políticas de valorização de grupos que estão historicamente numa situação de muita desvantagem. Na medida em que forem alvo de uma política positiva, essas desigualdades poderão cair de forma mais consistente." A publicação lançada ontem será mensal, acompanhando a Pesquisa Mensal de Emprego do IBGE. Hoje, em vários municípios brasileiros, incluindo São Paulo e Rio, é o feriado do Dia da Consciência Negra.