Com mais de 3 mil trabalhadores demitidos em oito meses, as centrais sindicais entraram em alerta com o Plano de Incentivo ao Desligamento Voluntário (PIDV) da Petrobras. Os sindicatos temem que a evasão de trabalhadores, associada à pressão pelo aumento de produção, amplie os acidentes e a precarização do trabalho. Eles denunciam que a estatal desligou funcionários operacionais sem substituição ou transmissão do conhecimento, contrariando o acordo previsto inicialmente.
A preocupação levou a Federação Única dos Petroleiros (FUP), filiada à Central Única dos Trabalhadores e ligada ao PT, a condicionar o apoio à reeleição da presidente Dilma a "mudanças estruturais" na estatal, segundo carta divulgada pela entidade no último mês.
As mudanças exigidas passam por mais concursos, redução de contratação de terceirizados, melhores condições de segurança e uma gestão "democrática". "Não escondemos as críticas. Não acredito na política feita por quem nunca foi à área operacional", diz o coordenador José Maria Rangel.
Até agosto, a Petrobras contabiliza a demissão de 41% do total de 7.309 funcionários que aderiram ao seu plano lançado em janeiro. Até dezembro, mais mil funcionários serão desligados, totalizando 4.370.
De acordo com a própria companhia, em planilha encaminhada aos sindicatos, entre os trabalhadores já demitidos estão 267 que só poderiam sair após a contratação de novos funcionários e o treinamento dos substitutos - o que não ocorreu.
Eles integram a categoria E do plano, com condições especiais para a demissão. São profissionais das áreas de engenharia de petróleo, técnicos de perfuração de poços, de manutenção, entre outras funções.
"Antecipou-se a saída de muitos experientes sem tempo de passar a experiência. Estamos vendo que não vamos ter mão de obra treinada e capacitada", avalia Aguinelson Camilo, ligado à Federação Nacional dos Petroleiros (FNP), formada pela dissidência de quatro sindicatos que antes integravam a FUP.
A entidade diz não ter vínculos partidários, mas também não poupa críticas à atual gestão e ao plano de demissões, descrito por Camilo como "nefasto". "Não apoiamos, como federação, nenhum projeto, principalmente um governo que tem feito uma besteira atrás da outra em relação a Petrobras", diz. Para ele, a condução atual "colocou em xeque a respeitabilidade" da empresa.
Demissões
O objetivo do plano é economizar mais de R$ 4 bilhões até 2017. Ao todo, de acordo com a planilha, 70% dos demitidos virão de áreas técnicas, sendo 1.200 diretamente ligados à operação - cerca de 16% do total. Somente na Unidade Operacional da Bacia de Campos, que representa 75% de toda a produção da companhia e as principais áreas do pré-sal, serão mais de 600 demissões.
"Até agora não vimos contratação de substitutos. Até porque, neste período eleitoral é proibido. Tem muita gente da área operacional que está saindo", descreve o diretor do Sindicato de Petroleiros do Rio de Janeiro, Emanuel Cancella. "Isso é preocupante, enfraquece a empresa e coloca em risco a segurança de todos os trabalhadores", completou.
Cancella também aderiu ao plano, mas desistiu antes de homologar a saída. Assim como ele, outros 320 funcionários fizeram as contas e avaliaram que a adesão não era atrativa financeiramente. Ele atua como técnico administrativo na área de Exploração e Produção da companhia, e seria demitido em dois meses. Segundo ele, há "burocracia e constrangimento" para quem desiste. "Algumas pessoas têm tratamento especial", diz.
Quem consegue ficar por mais tempo é classificado na categoria E, considerados "especiais" pela importância da transmissão do conhecimento. Internamente, são chamados de "algema de ouro", pois conseguiram estender o prazo de permanência na companhia e receberão as maiores indenizações. Os valores, segundo a companhia, chegam a até R$ 600 mil.
Em nota, a Petrobras informou que as categorias foram definidas com base na "necessidade de ações de gestão do conhecimento ou continuidade operacional, com garantia da segurança dos trabalhadores e das instalações". A estatal alega também que está prevista contratação antecipada de substitutos. "Os desligamentos não afetarão as operações da companhia, sob qualquer aspecto", diz a nota.
Cortes afetarão a área de refino
Operando com 98% de sua capacidade instalada e colecionando acidentes desde o final do ano, a área de refino da Petrobrás será uma das mais afetadas pelos cortes de funcionários efetivos da companhia. A previsão é que 16% do total de demissões atinja as refinarias do País. Além dos funcionários ligados à área operacional, o PIDV também prevê a demissão de 1.823 funcionários das áreas de segurança e manutenção de equipamentos.
Os cortes nas áreas de segurança e manutenção atingem engenheiros de segurança e de equipamentos, além de inspetores de segurança, técnicos de manutenção e de segurança. A companhia também prevê cerca de 500 demissões nas áreas operacionais, de categoria E, para as refinarias até 2017.
"Nesses setores a terceirização está em alta, e com isso a qualidade do prestador de serviço piorou também. É um efeito colateral que está acontecendo em todas as refinarias, que tinham capacidade para processar 1,9 milhão de barris e hoje operam acima de 2,2 milhões", afirma Simão Zanardi, sindicalista da Refinaria Duque de Caxias (Reduc), no Rio de Janeiro.
No último dia 25, uma equipe de 20 auditores do Ministério Público do Trabalho (MPT) esteve na unidade e autuou a Petrobrás pelo descumprimento de resolução que prevê a definição do número mínimo de funcionários para a operação em segurança das refinarias, como nas embarcações.
A consequência direta das demissões é o aumento dos incidentes e acidentes nas unidades. O sindicato contabiliza nove acidentes somente no mês de agosto. Um deles causou a morte do operador Antonio Rafael Santana, de 26 anos, na Reman, em Manaus. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.