Um eventual impeachment da presidente Dilma Rousseff pode aumentar a confiança do setor privado e fazer com que o segmento de infraestrutura passe a receber um fluxo maior de investimentos, segundo especialistas e empresários ouvidos pelo Broadcast, serviço em tempo real da Agência Estado. No entanto, as fontes ressaltam que o momento é de cautela, uma vez que a definição do cenário político ainda envolve muitas incertezas no curto prazo.
"Um novo governo talvez possa trazer a economia para um rumo mais previsível, mas o momento é de muita insegurança para antecipar uma solução", diz um empresário do setor portuário que pediu para não ser identificado. "Acreditamos que uma alternância no governo pode trazer soluções mais previsíveis e confiáveis, uma equipe mais sólida e menos desconexa, mas não geraria uma mudança dramática nas perspectivas para o setor."
O segmento portuário é o único que apresentou avanços no âmbito da segunda fase do Programa de Investimentos em Logística (PIL2), lançado pelo governo em junho de 2015, com a previsão de investimentos de R$ 198,4 bilhões em concessões de rodovias, ferrovias, portos e aeroportos, sendo R$ 69,2 bilhões entre 2015 e 2018 e R$ 129,2 bilhões a partir de 2019.
No entanto, o governo federal não conseguiu leiloar nenhum dos projetos rodoviários previstos para 2015 - o único leilão realizado no ano passado envolveu a concessão de três áreas no Porto de Santos. Um segundo certame de áreas portuárias, incluindo seis terminais no Estado do Pará, estava previsto para ocorrer em março deste ano, mas foi adiado para 10 de junho. A expectativa do governo é que ainda em 2016 sejam concedidos os aeroportos de Fortaleza, Salvador, Florianópolis e Porto Alegre, além de outras áreas portuárias e projetos rodoviários.
A postura cautelosa é compartilhada pelo advogado especialista em infraestrutura e sócio do L.O. Baptista-SVMFA, Fernando Marcondes. O especialista ressalta que um eventual governo Michel Temer, além de precisar lidar com um cenário de instabilidade política, ainda teria de enviar determinados sinais ao mercado para restabelecer a confiança do setor privado.
"O segmento de infraestrutura está paralisado, os sinais têm sido negativos há muito tempo e isso desestimulou a iniciativa privada", diz Marcondes, afirmando que a apresentação de um programa de governo com metas bem definidas seria um primeiro passo para estimular a iniciativa privada e promover a retomada de obras de infraestrutura. "Mas, para um reaquecimento definitivo, ainda precisamos de dois a três anos de recuperação da economia como um todo."
Já o diretor de Pesquisas Econômicas da Pezco Microanalysis, Helcio Takeda, avalia que um eventual governo Michel Temer passaria por um período de "lua de mel", com uma base que permitiria a realização de reformas econômicas. "Dentro de um programa de restabelecimento das finanças públicas, as concessões de rodovias e ativos de infraestrutura têm um papel importante, principalmente nos casos que envolvem o pagamento de outorga", destaca.
Intervencionismo
Segundo Takeda, outro ponto que pode fazer com que os investimentos sejam retomados é a percepção de que um novo governo adotaria uma postura menos intervencionista em relação ao setor de infraestrutura, sem determinar limites para a taxa interna de retorno (TIR) dos projetos, por exemplo. "Deixaria o ambiente mais competitivo, permitindo o acesso de players com potencial para desenvolver os projetos".
Para o presidente da Associação Brasileira dos Terminais Portuários (ABTP), Wilen Manteli, a questão do intervencionismo governamental aparece como obstáculo a ser combatido por um eventual novo governo para a retomada dos investimentos no setor portuário. "Independente de como fica a situação política, temos que reduzir o intervencionismo estatal na atividade. Isso fragiliza os contratos e atrapalha o desenvolvimento do setor", diz Manteli.
Prioridades
Takeda destaca que os segmentos rodoviário e portuário apresentam o maior potencial de crescimento, dada a necessidade de criação de vias de escoamento da produção brasileira, sobretudo a agrícola. "Rodovias têm um viés e uma atratividade melhor que as ferrovias, que possuem um custo de investimento mais alto."
Já o coordenador do Núcleo de Logística, Supply Chain e Infraestrutura da Fundação Dom Cabral, Paulo Resende, afirma que independente do desfecho das questões políticas, o setor de infraestrutura deve aparecer como prioridade para o governo.
"A economia brasileira já não aguenta mais o peso de tanta ineficiência na área, que já vem de muitos anos", diz Resende, ressaltando que, entre as 20 principais economias do mundo, o Brasil apresenta a menor taxa de investimento em infraestrutura em relação ao PIB.
Para o especialista, a deficiência brasileira no segmento acarreta em margens menores no setor produtivo e repasses permanentes de aumentos de custos de infraestrutura ao consumidor. "Na minha opinião, já não há mais condições de qualquer governante do Brasil, seja ele quem for, fugir da realidade de que hoje a infraestrutura do País se transformou em questão prioritária"