O endividamento da pessoa física cresceu 19,7% no ano passado e os compromissos das famílias com cartão de crédito, cheque especial, empréstimos bancários, Previdência Social e gastos direcionados para habitação e financiamento rural somaram R$ 637,393 bilhões, de acordo com números do Departamento Econômico do Banco Central. As informações são da Agência Brasil.
Esse estoque de dívidas é maior que os R$ 555 bilhões encontrados em pesquisa da LCA Consultores, segundo a qual esse valor equivaleria a cerca de 40% da renda anual da população. De acordo com o BC, o endividamento atual da pessoa física passa de 20% do Produto Interno Bruto (PIB), soma de todas as riquezas produzidas no país, estimado em R$ 3,130 trilhões.
O crescimento da dívida é visto, porém, com serenidade por alguns analistas de mercado, como o professor de economia da Universidade de Brasília (UnB), Roberto Piscitelli. Para ele, o aumento da dívida é sustentável em um quadro de evolução da economia, com mais renda, poupança e emprego formal. Piscitelli reconhece que o nível de endividamento das famílias é grande, mas acha que está dentro do razoável se comparado ao de países nos quais o comprometimento da renda familiar é muito mais alto, como o Chile e os Estados Unidos, nos quais o nível de endividamento beira os 100%.
Ele chama a atenção, contudo, para o fato de muita gente se deixar atrair pelas facilidades de acesso ao crédito e pelo alongamento das dívidas, porque os juros bancários no Brasil são muito altos. Quanto maior for o prazo, mais cara será a dívida. Além do mais, segundo ele, o tomador precisa ficar atento ao limite de sua renda.
Bancos
O aumento do risco e o crescimento dos índices de inadimplência nas operações de crédito, em decorrência da crise financeira, levou os bancos a aumentarem em 50% suas reservas para cobrir eventuais perdas com calote de clientes no ano passado. Segundo dados do Banco Central, as provisões encerraram o ano passado com um volume de R$ 97,6 bilhões, o equivalente a 6,9% do total de crédito fornecido pelas instituições financeiras públicas e privadas. Em 2008, essa reserva era de R$ 65,2 bilhões e correspondia a 5,3% do total de crédito concedido.
De acordo com analistas consultados pela reportagem, as dificuldades financeiras enfrentadas por muitas empresas ao longo do ano, especialmente as indústrias e companhias exportadoras, o aumento do desemprego no primeiro semestre e o impacto negativo na renda, fatores diretamente provocados pela crise, elevaram significativamente a chance de os clientes não honrarem seus compromissos com os bancos. E o volume de calotes efetivamente teve forte alta - mais de 60% de 2008 para 2009. ''A economia não estava favorável à qualidade creditícia'', argumentou o analista de bancos da Austin Rating, Luís Miguel Santacreu.
Essa situação forçou os bancos a separarem recursos para cobrir o risco de perdas, o que na prática diminui a lucratividade das instituições e também reduziu a capacidade de as instituições fazerem empréstimos. Uma medida adotada pelo Banco Central ao fim de 2008 também criou um incentivo para os bancos aumentarem suas reservas anticalote em 2009. A iniciativa, de caráter prudencial, permitiu que as instituições financeiras fizessem provisões adicionais ao que normalmente seria necessário para os créditos concedidos a pessoas e empresas sem que isso alterasse sua capacidade de financiar clientes.
Com isso, as instituições buscaram ampliar suas reservas, mas não perderam tanta musculatura para ofertar crédito, embora tenham mantido um ritmo lento de concessões em 2009. ''O BC induziu os bancos a ampliarem o excesso de provisionamento, porque o risco era muito grande. Foi um incentivo a se provisionar mais'', avalia o economista João Augusto Salles, da consultoria Lopes Filho, lembrando que esse mecanismo acabará em abril deste ano, o que deve levar a uma relativa ''desmontagem'' do excesso de provisionamento realizado pelas instituições. (Colaborou Agência Estado)