Passagens internacionais emitidas, com assentos marcados, e não validadas pela companhia aérea, reservas falsas em hotéis, cobranças em duplicidade nos cartões de crédito, ainda não estornadas, e até uso indevido de CPF por parte da empresa. Quando os clientes da Interlaken, agência de turismo que fechou suas portas repentinamente no último sábado (26), se reuniram na manhã desta segunda-feira (28), em Curitiba, perceberam que os danos causados eram maiores do que os estimados a princípio. Cerca de 70 pessoas participaram do protesto em frente à sede principal da operadora, localizada no bairro Ahú, em Curitiba. O ato começou às 8h30 e terminou por volta das 10 horas, por conta de uma forte chuva. Nenhum representante da operadora apareceu no local. Uma viatura da Polícia Militar (PM) acompanhou, de longe, a movimentação pacífica.
Os turistas já haviam criado três grupos de WhatasApp para discutir a situação – um com 100 e os outros dois com aproximadamente 80 integrantes cada, o que leva a crer que o número de prejudicados deva ser ainda maior. A advogada Mariana Bogus, que também comprou um pacote com a operadora, para os Estados Unidos, afirmou que o prejuízo calculado ultrapassa R$ 500 mil. Como nem todos os usuários foram contatados ou levantaram seus gastos, contudo, há quem estime o calote em mais de R$ 2 milhões. Os manifestantes combinaram de registrar as ocorrências na Delegacia de Estelionado e na de Crimes Contra a Economia e Proteção ao Consumidor. Também pretendem acionar o Ministério Público, para ajuizar uma ação civil pública. A ideia é que as medidas sejam tomadas em conjunto e de forma organizada.
FRUSTRAÇÃO
Uma das clientes, que preferiu não se identificar, disse que recebeu uma indicação de amigos e que antes de efetuar a reserva pesquisou o nome da operadora no Reclame Aqui, não encontrando qualquer registro de problema. Ela embarcaria anteontem com os pais para Orlando. Os três planejavam passar o Réveillon na cidade norte-americana. "Estávamos com as malas prontas, saindo para deixar os cachorros, e recebemos uma mensagem da Marselle (Benzi, uma das sócias) informando o cancelamento. Foi um choque. Além da perda do dinheiro, há todo o desgaste emocional", contou. A mesma usuária tinha comprado um pacote para maio, uma vez que possui um casamento nas proximidades da Disney. Só decidiu ir duas vezes porque tem onde ficar e porque considerou o preço atrativo. Caso a devolução não ocorra, o golpe chegará a R$ 10 mil, só em passagens.
A operadora, que funcionava ainda em dois shoppings da Capital, vendeu pacotes até 24 de dezembro, anunciando falência um dia depois. O empresário Guilherme Carrano iria para um casamento na Praia do Forte, na Bahia, em abril, com mais 13 amigos. "Todos estão com o mesmo problema. Compramos no dia 15 de setembro, pagamos 70% da viagem e o diretor comercial (Augusto Benzi) falou que não teria como arcar com nada". Ele contou que o grupo desembolsou R$ 60 mil, entre aéreo, hotel e translado, e que não tem esperanças de receber o dinheiro de volta. "Infelizmente, os preços subiram e não sabemos se teremos mais como ir. A gente só espera que eles (Interlaken) sejam punidos". Carrano afirmou, ainda, que no último dia 20 recebeu uma promoção da agência: seis noites em Las Vegas por 12 vezes de R$ 180. "Fiquei tentado. Ainda bem que não comprei. Agora, imagine quantos não caíram nessa".
Frustração parecida enfrenta a aposentada Edna Molinetti, que embarcaria em março num cruzeiro pelo Caribe, a partir de Cartagena, na Colômbia, com o marido, o pai e a filha. "A entrada e a primeira prestação já foram pagas e o resto havíamos parcelado. São quase R$ 10 mil. Mandamos um e-mail para a Interlaken, como solicitado, e até agora nada". Ela relatou que no ano passado viajou para o Nordeste com a mesma companhia e que o serviço foi prestado sem qualquer transtorno. A empresária Adriana Baraldi, por sua vez, planejava viajar em abril com o marido para os Estados Unidos e o Canadá. As parcelas já quitadas somam R$ 1,5 mil, no entanto, ela fez algumas reservas no Booking, que totalizam R$ 1,7 mil. "Está distante ainda, mas era o nosso sonho", lamentou.
A FOLHA procurou a agência, entretanto, o telefone só dava ocupado. A sócia Marselle Benzi pediu que a reportagem contatasse o advogado da operadora, mas a ligação caiu na caixa postal. O site da empresa foi retirado do ar. Já no Facebook a última mensagem postada é a de 26 de dezembro, relativa ao fechamento. "Após 30 anos de serviços prestados ao segmento de turismo, infelizmente encerramos as nossas atividades em função da crise econômica. Lamentamos muito o ocorrido e faremos o possível para sanar individualmente os danos causados a cada um dos clientes. Pedimos a gentileza que nos contatem através do e-mail contatointerlaken@gmail.com. Atenciosamente, Diretoria Interlaken".
Ministério Público
A Promotoria de Justiça de Defesa do Consumidor de Curitiba informou que está colhendo informações sobre o caso através do e-mail consumidor@mppr.mp.br. Cidadãos lesados devem encaminhar para o e-mail, com o título "TURISMO", identificação pessoal (nome completo, número do CPF e endereço), assim como cópia do contrato com a empresa e outras documentações que considerarem necessárias.
Diante da notícia do encerramento dos trabalhos da empresa, a Promotoria recomenda, ainda, que os lesados procurem, até o dia 3 de janeiro, o Ciac-Sul (8% Distrito Policial), na Av. Presidente Wenceslau Braz, 47 – Bairro Portão, tel. 3212-6100, e, a partir do dia 4 de janeiro a Delegacia de Crimes Contra a Economia e Proteção ao Consumidor (Delcon), na Rua Ermelino de Leão, 513 – Centro, em Curitiba, para realização de Boletim de Ocorrência.
Colhidas as informações, a Promotoria instaurará inquérito civil para apuração completa do caso, visando a responsabilização dos proprietários da empresa e futuro ressarcimento das vítimas.