O diretor-executivo do Fundo Monetário Internacional (FMI) Otaviano Canuto afirmou nesta quinta, 6, que a crise política não é favorável ao ajuste na economia que o governo tenta tirar do papel em 2015. Segundo o economista, o programa de ajuste deveria ser apoiado por todas as esferas do governo e pelo País como um todo. Além disso, a rapidez na condução das medidas é crucial para que o Brasil retome o crescimento.
"A falta de claridade nas tendências do Congresso não é uma boa notícia. O programa de ajuste tem que pertencer ao governo e ao País como um todo", disse Canuto após participar do seminário "A Agenda de Crescimento do Brasil", promovido pelo Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (Ibre/FGV).
Canuto esquivou-se de uma avaliação mais firme sobre a posição do Congresso, se ajuda ou atrapalha o governo no cumprimento do ajuste fiscal. "Tem que ver se a pauta-bomba é para valer ou não", disse. Mesmo assim, o diretor-executivo do FMI afirmou que a redução da meta de superávit primário - uma "atitude correta" diante da desaceleração mais intensa do que a prevista - deveria servir de "chamamento" para o Congresso ajudar na mudança estrutural dos gastos básicos. As reformas são importantes para que o País atinja superávits primários maiores e garanta o grau de investimento.
"Tudo que prejudique a consecução de resultados não é favorável ao ajuste. Quem sabe sair da crise política seja equivalente a chegar a um consenso no que diz respeito ao suporte ao que o País deveria fazer na área fiscal", afirmou Canuto. "Como o vice-presidente Michel Temer disse ontem da maneira mais brilhante do que eu poderia dizer, menos ruído e mais convergência."
O diretor-executivo do FMI ainda evitou comentar o debate sobre um possível impeachment da presidente Dilma Rousseff. "Única coisa que digo é o seguinte: quanto mais suave e rápido for o processo de mudanças de leis que alteram a dinâmica dos gastos, melhor do ponto de vista macroeconômico e de crescimento", disse.
O FMI, entidade em que Canuto representa o Brasil, tem acompanhado a evolução da atividade e a própria crise política vivida pelo País. Porém, o diretor-executivo do Fundo não acredita que o imbróglio entre o Executivo e o Legislativo vá influenciar a decisão de agências de classificação de risco, uma vez que o critério adotado é se o País tem capacidade e disposição de arcar com os juros da dívida pública. "Mas o aumento de gastos não é boa notícia (para o rating)", reconheceu.
Comércio exterior
Além disso, Canuto disse que a desvalorização do real ante o dólar não é solução de curto prazo para os problemas conjunturais do Brasil. Segundo o economista, o governo deveria focar em uma "subagenda" de reformas, com foco em temas como a facilitação do comércio com o restante do mundo.
Canuto ressaltou também que o câmbio, embora tenha um impacto imediato sobre as importações, demora pelo menos quatro trimestres para trazer efeitos sobre as exportações. "Não dá para imaginar que depreciação cambial seja solução de curto prazo para problemas conjunturais", afirmou. Além disso, ele fez questão de dizer que 2015 não é 1999, ano em que houve a maxidesvalorização do real após anos de câmbio fixo e paridade com o dólar.
"Não dá para ter a mesma expectativa do impacto benigno que a desvalorização do real teve, entre outras razões, pelo porcentual maior das commodities nas exportações. Esse é um fator mais exógeno, não depende tanto do câmbio, e agora estamos numa fase não tão favorável. Além disso, o diferencial de inflação em relação aos parceiros lá fora é bem maior do que em 1999", disse o diretor-executivo do FMI. Outra diferença é que o crescimento mundial já não é mais tão intenso, acrescentou.
Uma saída importante para o Brasil é "descer em detalhes" e trabalhar em uma subagenda de reformas, mirando o longo prazo. "Uma forma de incrementar o intercâmbio comercial no Brasil é justamente cortando alguns aspectos do 'doing business' que são altamente deletérios no Brasil. Seria uma reforma mais profunda, que envolvesse redução de tarifas, de modo que o País pudesse se beneficiar de integração produtiva com o restante do mundo", disse Canuto.
O diretor-executivo do FMI tem insistido na defesa de que o Brasil reveja suas políticas de comércio exterior, de modo a melhorar o quadro das exportações. Hoje, o superávit na balança comercial é explicado metade pela desaceleração da economia (que diminui as compras do exterior) e metade pelo câmbio (que tem agido muito mais para inibir importações do que estimular exportações, na avaliação do economista).
"Além disso, se a economia volta a acelerar, metade desse superávit vai embora", lembrou. A reforma que permitirá o avanço do comércio exterior brasileiro é menos dependente de câmbio e mais de mudanças estruturais. "O protecionismo comercial não aumentou no mundo. Aumentou no Brasil, mas no mundo não", justificou Canuto.