A operadora de caixa Fábia Maria da Silva, 46, foi surpreendida ao conferir seu extrato do FGTS (Fundo de Garantia do Tempo de Serviço) no aplicativo, em setembro deste ano. Parte do saldo -cerca de R$ 10 mil- estava bloqueado sem que ela tivesse feito nenhuma movimentação na conta.
Ao procurar uma agência da Caixa Econômica Federal para saber o que aconteceu, ela conta que descobriu que sua conta do Fundo de Garantia havia sido invadida por golpistas, que fizeram a adesão ao saque-aniversário, sacaram duas parcelas por dois anos seguidos e, em maio de 2024, realizaram um empréstimo em seu nome, dando seu FGTS como garantia.
Fábia foi vítima de uma fraude que ganhou força na pandemia e tem atingido trabalhadores desde então: o golpe do saque do FGTS, no qual os criminosos roubam dados pessoais, sacam parcela do Fundo de Garantia, e, agora, ainda fazem empréstimo fraudulento, deixando uma dívida para a vítima.
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No caso da operadora de caixa, os golpistas conseguiram seu CPF e outros dados pessoais e, com isso, acessaram seu aplicativo do FGTS e fizeram movimentações dentro do app, aderindo ao saque-aniversário, que libera uma parte do valor uma vez por ano, no mês de aniversário do trabalhador.
Aderir a essa modalidade, criada em 2019 pelo então ministro da Economia, Paulo Guedes, traz consequências. O trabalhador não tem mais acesso ao saque-rescisão. Caso seja demitido, fica sem direito de acessar seu saldo no fundo e recebe apenas a multa de 40% paga pelo empregador.
Ela conta que a adesão dos golpistas foi feita em 2022 e, desde então, os criminosos fizeram dois saques do FGTS, sempre no mês de aniversário dela, e, ao perceber que a trabalhadora não tinha notado as retiradas, realizaram um empréstimo por meio do saque-aniversário, quando é possível contratar uma linha de crédito para antecipar parcelas futuras, com cobrança de juros.
Fábia diz ter o hábito de checar seu extrato do FGTS no aplicativo para saber se os depósitos do empregador estão corretos, mas não percebeu a adesão ao saque-aniversário. Ela levou um susto apenas ao ver seu saldo bloqueado.
"Fui na Caixa para saber o porquê, e o funcionário perguntou se eu tinha feito empréstimo no Banco Pan. Eu falei que não e ele me disse que fizeram um empréstimo no meu nome e estão usando o saldo do meu FGTS", diz ela.
Segundo Fabio Assolini, diretor da equipe global de pesquisa e análise da Kaspersky para a América Latina, por se tratar de um benefício muito popular, o FGTS é usado em vários golpes, assim como outras rendas pagas pelo governo federal.
"Vimos durante a pandemia muitos golpes usando vários benefícios, e a razão também é porque a Caixa, além de manter o FGTS, mantém os programas do governo. É muito comum encontrar golpes usando FGTS e Bolsa Família", afirma.
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Como o criminoso consegue os dados?
Segundo Assolini, a forma como agem os golpistas varia. Eles precisam conseguir os dados pessoais do trabalhador que, neste caso, podem ser acessados na internet, quando há vazamento de informações, ou quando os informamos em sites não tão seguros. Em geral, precisam de acesso a nome completo, endereço, número de CPF e telefone, por exemplo.
Outra forma de ter acesso aos dados é quando o cidadão clica em links suspeitos que recebe por WhatsApp, SMS ou email e outras redes sociais, como Facebook e Instagram. Há ainda os que fornecem os dados ao ser procurado por golpistas que se fazem passar pelo gerente do banco.
Como ocorre o golpe do saque-aniversário do FGTS?
O fraudador usa os dados do cidadão para fazer a autenticação do FGTS no aplicativo. Em geral, é possível invadir contas nas quais o trabalhador não cadastrou email.
Neste caso, o fraudador diz que esqueceu a senha, cadastra um endereço de email no nome dele e começa a fazer movimentações, e a vítima nem percebe, porque não recebe as notificações já que o email para onde elas estão sendo enviadas é outro.
Como o golpista consegue fazer empréstimo em nome da vítima?
Com os dados pessoais do trabalhador, é possível abrir conta em outros bancos, especialmente os digitais, e usar a inteligência artificial para simular a validação por biometria facial, ao roubar também uma foto da vítima.
"Vivemos uma avalanche de vazamento de dados, então é muito fácil para o criminoso obter acesso à conta do FGTS com essa validação somente baseada com dados pessoais, com seu nome, endereço e nome dos pais."
Com a conta aberta, é possível movimentar o dinheiro, recebendo as parcelas do saque-aniversário e realizando empréstimo. A vítima fica apenas com a dívida.
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O que fazer para se proteger?
Assolini dá duas dicas. A primeira é a básica, de não clicar em links externos recebidos por WhatsApp, SMS e email, além de não fornecer seus dados a ninguém que faça ligações em nome do seu banco ou instituições financeiras solicitando dados pessoais.
A segunda dica diz respeito à checagem, ao menos mensal, de suas informações financeiras na plataforma Registrato, do Banco Central. Lá, é possível identificar empréstimos em seu nome, além de outras informações.
- Acesse o site registratobcb.gov.br
- Informe seu CPF
- Informe sua senha do Gov.br
- Vá em "Consultar" e acesse seus relatórios
O especialista indica ainda ao trabalhador registrar um email em sua conta do aplicativo do FGTS para que, se houver qualquer movimentação suspeita, seja avisado antes que o criminoso consiga mudar a senha, cadastrar outro email, sacar valores e trazer prejuízos.
O que dizem a Caixa e o Banco Pan
A Caixa afirma que, em caso de movimentação não reconhecida pelo cliente, é possível realizar pedido de contestação em uma das agências do banco com CPF e documento de identificação.
Segundo a instituição, as contestações são analisadas de forma individual, "considerando os detalhes de cada caso e, para os casos considerados procedentes, o valor é ressarcido ao cliente".
A operadora de caixa teve os valores devolvidos.
Já o banco Pan cancelou o empréstimo depois de ser procurado. "O banco reitera sua diligência e atenção para situações como esta, e repudia qualquer ato irregular, que prejudique o sistema financeiro como um todo", afirmou, em nota.
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