A Polícia Civil e a Polícia Militar abriram procedimentos para investigar a conduta de seus agentes ao atenderem caso de estupro coletivo de uma mulher de 34 anos. A vítima foi conduzida à delegacia ao lado dos seus agressores e voltou a ser molestada no carro da PM. Na delegacia, o agente escreveu termos vulgares ao registrar a ocorrência, como "só gritou quando empurraram um galho de árvore na sua bunda". Dois adolescentes foram apreendidos pelo crime. Era o quarto ataque sexual que a mulher sofria do mesmo grupo.
O caso foi revelado pelo jornal Extra. A vendedora X., de 34 anos, foi atacada na madrugada de segunda-feira, 17. Ela estava em um bar com um amigo, no bairro Lagoinha, em São Gonçalo, na região metropolitana do Rio de Janeiro, quando quatro jovens ligados ao tráfico da região a arrastaram para o banheiro do bar. De lá, ela foi levada para uma rua deserta e com pouca iluminação, onde passou a ser estuprada pelo grupo. Um carro do 7º Batalhão da PM (São Gonçalo) passou pelo local, a encontrou nua e a socorreu.
Mais à frente, os policiais encontraram os adolescentes, que foram reconhecidos pela mulher. Eles foram detidos e sentaram na mesma viatura, ao lado da vítima. No caminho para a delegacia, um deles alisou sua perna e a ameaçou: "Fica tranquilinha, vai dar tudo certo".
A vendedora foi levada para a 74ª Delegacia de Polícia (Alcântara), que não tem Núcleo de Atendimento à Mulher nem seguiu o novo protocolo da Polícia Civil para atendimento de vítimas de violência sexual, que prevê "atendimento humanizado à vítima, proporcionando condições necessárias para que ela possa comunicar a violência sofrida".
No registro de ocorrência, o policial escreveu expressões como "boquete triplo", "fizeram anal e vaginal", "não usaram camisinha, no pelo", e ainda "que a declarante só gritou quando empurraram um galho de árvore na sua bunda".
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"Não é fácil. Durante o depoimento, fiquei muito desconcertada. Tinha acabado de acontecer tudo aquilo comigo. Estava sentindo dor e ainda muito abalada. Depois, fui para casa e me senti muito abandonada", disse a vendedora, em entrevista ao Extra.
A vendedora contou que há quatro anos um ex-namorado divulgou vídeo íntimo gravado sem consentimento na favela onde ela mora. Depois disso, os traficantes a estupraram quatro vezes, em quatro anos.
"Estou me sentindo completamente desamparada. Eu tinha medo de que justamente isso pudesse acontecer se eu registrasse o caso. Minha vida está devastada. Eu e minhas filhas não podemos ir para casa. As amigas das minhas filhas foram a minha casa e encontraram tudo revirado. Tentaram levar até a minha máquina de lavar", disse ao jornal.
A polícia abriu inquérito e tenta localizar os outros criminosos. A Chefia de Polícia Civil determinou a redistribuição do inquérito policial à Delegacia Especial de Atendimento à Mulher (DEAM) de São Gonçalo. O caso segue em sigilo e está sendo acompanhado pela Comissão de Direitos Humanos da Assembleia Legislativa e pela Secretaria Estadual de Direitos Humanos. A mulher está na casa de amigos.
"A Polícia Civil destaca que, diante de eventual descumprimento do protocolo de atendimento e da conduta do policial civil veiculada pela imprensa, o delegado titular da 74ª Delegacia de Polícia instaurou procedimento para apurar a ocorrência de infração disciplinar", informou a Polícia Civil, em nota.
Já a PM informou que outras viaturas estavam ocupadas em outras ocorrências, "por se tratar de área de risco". "A ação da PM foi fundamental para que acusados de envolvimento neste crime fossem presos. Todavia, as circunstâncias da ocorrência em que a vítima foi atendida e que dois suspeitos foram presos serão apuradas."
Estupro coletivo
Em maio, uma adolescente de 16 anos foi vítima de estupro coletivo numa favela da zona norte e os criminosos divulgaram vídeos e fotos da jovem desacordada. Ela chegou a dizer que "acordou com 33 homens em cima" dela.
A polícia, no entanto, entendeu que, "por perturbação ou trauma", ela fez a confusão. Raí de Souza e Raphael Duarte Belo estão em prisão preventiva pelo crime de estupro. O traficante Moisés Camilo Lucena, acusado do mesmo crime, está foragido.