O governo brasileiro desconsidera a possibilidade de adotar medidas de reciprocidade consular em relação ao Reino Unido em reposta à detenção, há dois dias, no Aeroporto Heathrow, em Londres (Reino Unido), do brasileiro David Miranda. A hipótese não é avaliada porque o caso de Miranda é isolado. O brasileiro é companheiro do jornalista do diário inglês The Guardian, Glenn Greenwald, que divulgou informações sobre o esquema de espionagem do governo norte-americano. O assunto é tratado pelas autoridades como tema político e não técnico-consular. Para o governo brasileiro, houve violação de direitos humanos.
No ano passado, o governo do Brasil exigiu da Espanha um tratamento respeitoso aos cidadãos brasileiros que viajam para cidades espanholas. Na ocasião, houve relatos de discriminação e maus-tratos a brasileiros. O Brasil adotou a chamada reciprocidade, aumentando o rigor na entrada de espanhóis em território brasileiro. Mas, na ocasião, os especialistas avaliaram que a situação era, sobretudo, técnica, pois ocorria com frequência e de forma sistemática.
Porém, no caso de Miranda a área consular do governo interpreta de forma diferenciada. O caso do brasileiro, retido por quase nove horas, é considerado grave e fora do perfil. Em geral, segundo especialistas, brasileiros ficam detidos por problemas migratórios. Não há registros de dificuldades causadas por suspeitas de terrorismo.
A retenção de Miranda foi recebida com surpresa pelos especialistas em área consular do governo, pois não há registros de situações parecidas de detenção de brasileiros por suspeitas de envolvimento com terrorismo no Reino Unido. O brasileiro foi retido anteontem (18) sob a Cláusula 7 da lei antiterrorismo.
A Cláusula 7 permite à polícia britânica deter qualquer pessoa na fronteira do Reino Unido, sem a exigência de apresentar uma causa provável, e mantê-la por até nove horas, sem justificativa adicional. O detido deve responder a todas as perguntas, mesmo sem advogado presente. É considerada crime a recusa em responder às perguntas - independentemente dos motivos - ou não cooperar plenamente com a polícia.
Ontem (19), entretanto, o ministro das Relações Exteriores, Antonio Patriota, conversou por cerca de dez minutos, por telefone, com o chanceler britânico, William Hague, cobrando explicações sobre a retenção. Patriota mencionou que a medida causou indignação tanto da opinião pública quanto do governo. Ele reiterou que a retenção é injustificável.