Candidatos, estratégias de sabão, e eleição em tempos de redes sociais.
O marketing eleitoral distancia-se cada vez mais da cartilha da publicidade. Hora de rever e incrementar conteúdos e argumentos para o cenário atual.
O jingle de cerveja que não saía da cabeça teve a letra trocada. Em vez da bebida número um, havia o ‘candidato número um’. Em outro canto do país, concorrendo à prefeitura, o político entoava: ‘sorria, meu bem, sorria... É fulano no peito, é fulano prefeito, neste a gente confia’.
E em tempos mais distantes, Chitãozinho e Xororó cantavam a música-tema de uma chapa à presidência da república, usando sua melodia com a letra vendedora do candidato. O marketing eleitoral surfa em sucessos conhecidos para alavancar seus candidatos. Chama isso de recall, segundo a lógica de que não é preciso inventar um novo hit se você pode associar seu candidato a uma mensagem já conhecida e consagrada.
Nos exemplos acima, o primeiro candidato nem chegou a concorrer, por conta de um escândalo antes da eleição. No segundo caso, o candidato elegeu-se, mesmo tendo iniciado em terceiro lugar nas pesquisas. E na última situação, o candidato perdeu a eleição presidencial no segundo turno. De fato, não há regras para o sucesso. Mas algumas fórmulas aplicadas para o marketing são as mesmas e se tornaram protocolares para nove entre dez campanhas eleitorais. Sucesso garantido? #sqn. E não se trata apenas de mudar jingles, obviamente.
As redes sociais transformaram com força avassaladora a publicidade e a forma de se comunicar. A conhecida marca de sabão sempre trazia em seus comerciais supostas donas de casa, depondo sobre a brancura exclusiva proporcionada pelo produto. Eram atrizes, claro.
Sabíamos na época e sabemos agora. Mas hoje, a maquiagem perfeita, a declaração bem articulada, as palavras cuidadosamente escolhidas não surtem mais o mesmo efeito. Apesar da fórmula ainda ser usada, seu resultado mudou: é força da repetição que introduz os conceitos.
Mas a credibilidade beira a zero. Ninguém crê nas donas de casa de comercial. E é exatamente aí o ponto de ruptura entre o passado e o presente do marketing: antes fingia-se que era tudo verdade e o público não tinha como reagir. Hoje, eleitores e consumidores estão saturados dessa encenação. Reflexo disso é a frase espalhada pelas redes sociais: ‘Quero morar na propaganda do governo’. É a resposta para a discrepância entre a realidade mostrada e aquela em que as pessoas vivem.
Além dessa mudança de abordagem na publicidade, o marketing eleitoral tem o desafio de vencer a descrença e a desesperança provocadas por sucessivos escândalos. Hoje, associa-se ‘político’ a ‘desonestidade’ de forma automática. Por isso, há, como nunca, a necessidade de conteúdos verdadeiros, de argumentos factíveis. Uma lorota contada por um candidato não se sustenta por minutos, nestes tempos de comunicação em tempo real. Um flagrante de descuido, uma gravação de telefone celular, um vazamento de áudio. Em poucos segundos, a credibilidade é atacada e, aos poucos, destruída. O marketing não pode evitar os erros, mas certamente tem condições para amenizar seus efeitos, desde que haja uma base consolidada de conteúdos verdadeiros. A questão é agir rapidamente e com segurança.
Em toda a última década de pleitos eleitorais, a internet ganha cada vez mais peso decisório por conta disso. Ainda não é essencialmente determinante, mas tem um papel fundamental na estratégia de marketing: molda conceitos e ajuda a difundi-los, com enriquecimento constante de argumentos. Uma frase de efeito cunhada num post ou num tweet rapidamente ganha reverberação também no ônibus lotado, no cafezinho da esquina, num debate universitário. As hashtags, por exemplo, extrapolam o mundo virtual, podem se tornar gritos de guerra e ainda avançam como origem de conceitos mais elaborados. É fácil identificar esses fenômenos.
Recentemente, na batalha do impeachment contra a presidente Dilma Roussef, a hashtag #nãovaitergolpe foi utilizada quase três milhões de vezes em poucos dias, segundo o site de monitoramento Keyhole. A hashtag, que é uma mensagem resumida, utilizada para reunir pensamentos ao redor de um assunto, funciona exatamente como base conceitual. Um usuário, a partir da hashtag, desenvolve um argumento mais detalhado, por exemplo, evocando que um golpe político não precisa necessariamente ser violento, mas pode ser apenas conspiratório. Outro usuário, contrário ao governo, pode usar a mesma hashtag para dizer que #naovaitergolpe porque o golpe já aconteceu, diante da má administração do governo. Ou seja, aos poucos, o conceito resumido da hashtag ganha avanços argumentativos, de modo que uma pequena ideia se desenvolve em muitas outras. A importância da internet e das redes sociais é que elas geram argumentos e os replicam em velocidade exponencial. Se antes uma campanha comercial levava semanas para surtir efeito, a internet permite alcançar milhões de usuários em poucos minutos. Ao extrapolar a hashtag, as redes sociais desenvolvem um processo de comunicação em que argumentos são gerados quase que infinitamente.
Estes três aspectos, a exaustão de velhas fórmulas; a crise de credibilidade sofrida pelos políticos; e a argumentação consistente que pode surgir de redes sociais convergem como principal foco do marketing eleitoral neste momento. São a base para que profissionais do setor entendam como serão as campanhas deste ano. Não há precedentes históricos para comparar um cenário complexo como o atual e de como ferramentas tradicionais podem funcionar. Mas a abordagem certamente terá de ser diferente, focada em conteúdos consistentes e melhor desenvolvidos. O marketing tem a função de alinhar narrativas pessoais, políticas e que venham de encontro com o interesse do eleitor. Ou seja, é preciso equilibrar as narrativas entre a trajetória de vida do candidato político, suas articulações com os organismos partidários e institucionais e, por fim, sua conexão com a sociedade.
Continuar a vender um candidato como um sabão em pó é a certeza de apenas fazer espuma.
Por Gildo Yamashiro, jornalista e consultor/coordenador de marketing político
Atuou em campanhas como as de José Serra (para presidente), Sergio Cabral e Maria Abadia (para governador), Odelmo Leão e Cássio Tanigushi (para prefeito), além da experiência em campanhas para vereadores e consultoria e media training para partidos e coligações em vários Estados.
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