Em agosto do ano passado, a pedido da Revista Brasileiros, fiz uma matéria de perfil de Arnaldo Tsuruda, o proprietário da lanchonete Arnaldo Lanches, de Londrina. Era para ser publicada em uma série sobre empresários. Mas aí veio a crise econômica mundial e a série foi adiada.
Mas, pelo jeito, para o Arnaldo não existe crise. A loja está sempre cheia. E o engraçado é que ele começou com o negócio em tempo de crise. Bom, abaixo, publico o texto do jeitinho que escrevi para a revista. O Sergio Ranalli fez as fotos, mas ele está viajando. Quando ele voltar, peço os arquivos e publico os retratos aqui.
O mundo é o limite
Arnaldo Tsuruda começou vendendo cachorro-quente em um simples carrinho, na rua. Caprichou no molho, fez clientela e hoje é dono de duas grandes lanchonetes em Londrina, no Paraná. Porém, ele quer mais. Os estudos de um grande projeto de franquia para os seus lanches estão a todo vapor e a meta atravessa as fronteiras do Brasil
Por WILHAN SANTIN
Corria o ano de 1991. O cenário econômico brasileiro era dos mais complicados. Um ano antes, a inflação acumulada fora de 1.476% e o então presidente Fernando Collor decretara o bloqueio das cadernetas de poupança e das contas correntes. Naquele tempo, investir era um verbo que soava aos ouvidos dos brasileiros como sinônimo de medo.
Mas no caso do empresário Arnaldo Tsuruda, a empolgação superava qualquer coisa. Ele tinha em mente que, se trabalhasse para valer, seriam consideráveis as chances de o carrinho de cachorro-quente que pretendia instalar em uma calçada de Londrina (PR) se tornar rentável, afinal, a história da família de oito irmãos em que ele nasceu é assim, de muito trabalho.
Os Tsuruda estão entre os milhares de japoneses que vieram para o Brasil nas primeiras décadas do século 20 em busca de vida melhor. Calejaram as mãos trabalhando como empregados em lavouras paulistas, juntaram algum dinheiro, e chegaram à terra vermelha do Norte do Paraná para trabalhar em terra própria, comprando lotes vendidos a perder de vista pelos ingleses que colonizaram a região.
"Um carrinho de cachorro-quente exigia pouco capital. O que eu tinha no bolso dava para começar. Além disso, eu gostava da idéia, acreditava que ia dar certo", recorda Arnaldo. E assim ele foi para a porta de um dos maiores colégios públicos da cidade, com a vontade e seu carrinho de chapa. "Era um tempo em que quase todos os descendentes de japoneses iam para o Japão. Eu tinha essa oportunidade, mas preferi acreditar no Brasil", completa, lamentando em seguida os sobrinhos e irmãos que engrossam o número de nisseis e nikkeys que hoje trabalham na "terra do sol nascente".
No entanto, nem mesmo nos melhores sonhos do empolgado "lancheiro" estavam as enormes filas que logo se formariam nas calçadas para provar de seu pão prensado com salsicha, molho e um recheio que os outros ainda não ofereciam: o frango desfiado. Acertou no sabor. Rapidinho, tinha clientela cativa e que não parava de aumentar. Nas noites quentes, faltavam cadeiras e o pessoal sentava no chão. Nas noites frias e chuvosas ele não vencia atender os carros que encostavam e buzinavam. Teve que colocar mais uma chapa no carrinho e contratar ajudante. A produção chegou a 800 lanches por noite. Não dava mais. Depois de 10 anos na rua, aceitando vale-transporte como pagamento e encarando um baita desconforto, era preciso abrir uma loja.
Rumo à franchising
Para comprar um terreno em uma das avenidas mais movimentadas de Londrina e construir o Arnaldo Lanches, em 2001, o empresário teve que vender tudo que havia conquistado em uma década na rua. Valeu a pena. Há dois anos, ele inaugurou a segunda loja. Os lanches continuam os mesmos de quando ele começou. As opções são poucas para os clientes, que podem escolher entre ter ou não frango no meio do pão e optar por uma ou duas salsichas. O preço varia de R$ 3,90 a R$ 5,50. Porém, não diversificar permite produzir em escala. A chapa, ainda comandada pessoalmente por Arnaldo, é uma verdadeira linha de montagem. "Vou para a chapa porque é preciso estar junto com a equipe. Acho que esse é um dos motivos do sucesso", comenta.
Ele não revela quantos lanches produz por dia, mas outros números dão uma boa pista: usa sete mil quilos de frango por mês, tem 24 motoqueiros na rua para dar conta das entregas e conta com uma equipe de 60 pessoas.
Dezessete anos depois de ter montado um carrinho de cachorro-quente para trabalhar na rua, o "japonês" de jeito calmo, fala mansa e que não pára de cumprimentar gente enquanto conversa com a reportagem de Brasileiros em uma das mesas de sua loja, começa a investir em uma nova empreitada. Londrina, com seus 498 mil habitantes, já ficou pequena para os sonhos dele. A meta agora é transformar o Arnaldo Lanches em Arnaldo’s e espalhar uma rede de franquias pelo Brasil e, quem sabe, pelo mundo.
O projeto é ousado e planejado. Um dos primeiros passos é um estudo de um processo de automação para a produção dos lanches, tecnologia que o próprio empresário está bolando. "Estamos produzindo um sistema pneumático, que vai fazer a prensa dos pães funcionar por um simples apertar de botão, evitando que o `chapeiro´ tenha que ficar fazendo força. Uma outra máquina vai passar maionese, catchup e mostarda, eliminando o contato manual e o uso de bisnagas. Isso vai nos dar padronização, rapidez e facilidade para treinar os funcionários", explica.
Os franqueados também vão aprender o ponto da maionese que ele mesmo fabrica utilizando ovo em pó e o segredo, guardado a sete chaves, do molho picante que ele produz - receita de uma cliente antiga - que faz sucesso entre os consumidores do lanche do Arnaldo.
Para não errar o alvo, o empresário fez questão de contar com ajuda profissional e estudos. Contratou o Grupo Cherto, um dos mais tradicionais do país quando o assunto é franquia. "Estamos felizes, pois os estudos concluíram que o nosso produto é franqueável. Cremos que podemos explorar a nível mundial. Mas, é claro, vamos começar devagar, testando regionalmente", explica Tsuruda, ressaltando que tem que saber fazer as coisas no tempo certo, mesmo já tendo mais de 40 pedidos, de diversos estados brasileiros, de autorização para franquia.
"Esse projeto não é uma questão de ganância, mas de melhorar o nosso serviço. Desde o início até hoje trabalhei com muita dedicação e honestidade. Provamos que o negócio é bom e queremos oferecer a outras pessoas a possibilidade de ficar aqui no Brasil", finaliza Arnaldo, que não abre a loja aos domingos porque acha que os funcionários e ele também devem passar pelo menos um dia por semana com a família.