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Tenho cara de tonto

31 dez 1969 às 21:33

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A via sacra

Lá vou eu, todo bonitão, à agência da gloriosa Caixa Econômica Federal. Acontece que casei e resolvi resgatar a grana do FGTS para comprar a casa própria. É direito meu, afinal a grana é minha, foi descontada do meu salário e ficou retida lá na Caixa porque tive a sorte de nunca ser demitido.

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Bom, chegando lá, no balcão de informações, o cidadão que estava atendendo não fez muita questão de me ouvir.
- Não é aqui. Você deve ir a um correspondente da Caixa que atende no centro da cidade.
- Mas eu não quero fazer financiamento, já tenho parte da grana. Só quero resgatar o FGTS para conseguir chegar ao valor do apartamento que desejo comprar.
- Então, é lá no correspondente Caixa mesmo.

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Até logo

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Descanse em paz, João.


Na mesma tarde fui ao local indicado. Um cidadão me atendeu sem muita vontade.
- Ih! rapaz! Isso não é aqui, não. Aqui só financiamento.

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No dia seguinte, antes do formidável horário de funcionamento bancário, que só abre as portas às 11h, eu já estava na fila em frente à Caixa. Portas abertas, mais uma vez vou ao balcão de informações. Uma moça me atende, também não dá muita pataca, e mais uma vez ouço que estou no lugar errado.


- Você tem conta aqui?
- Não.
- Então você tem que ir ao banco no qual você tem conta.
- Mas moça, a vida inteira eu ouvi dizer que resgate de FGTS é na Caixa!
- Não. O FGTS só fica depositado na Caixa. Para resgatar é no banco onde você tem conta.

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Respiro fundo, conto até 10 e vou até o Itaú, o banco que cuida do meu rico dinheirinho. Mais uma filinha básica. Explico para a moça que me atende. Ela apresenta uma cara de interrogação após o meu relato. Vai se informar com outra, que se informa com outra, que pergunta para um outro. Ela volta com a resposta.
- Wilhan, é lá na Caixa que você tem que ir.


Um, dois, três, quatro, cinco, seis... Volto à Caixa. No balcão de informações estão o senhor que me mandou ao tal correspondente no dia anterior e a moça que havia me dispensado um pouquinho antes. Ambos fazem cara de quem chupou limão ao me ver. A moça insiste que estou no lugar errado.
- Então, por favor, eu quero por escrito essa informação, em papel timbrado da Caixa e assinado por você dizendo que não é aqui que se faz o processo para resgate de FGTS.
- Nós não fornecemos esse documento.

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O senhor que trabalha com ela resolve intervir. Explico para ele que estou me sentindo como um otário, indo para lá e para cá. Ele me dá um número de telefone e diz que devo ligar e agendar um horário para ser atendido pelo pessoal que cuida do FGTS.
- Esse número de telefone é aqui da agência?
- Sim.
- Mas eu já estou aqui! Vou ter que ligar aqui para fazer o agendamento? O senhor não pode agendar para mim?
- Não. Só por telefone.


Ainda dentro da agência, ao lado do terrível balcão, saco o celular e gasto meus escassos créditos.
- Caixa, bom dia!
- Bom dia! Gostaria de agendar um horário para ser atendido pelo pessoal do FGTS.
- Já não há mais horários para hoje.
- Tudo bem. Pode ser para amanhã.
- Para amanhã, o senhor tem que ligar amanhã. Só agendamos para o mesmo dia.
- Moça, este agendamento não pode ser feito diretamente na agência.
- Sim.
- Caramba, eu já estava na fila antes de a agência abrir, fui um dos primeiros a chegar ao balcão de informações e não me agendaram. Pelo contrário, estão me fazendo de besta.

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Não sei de onde, mas a moça com a qual eu falava/reclamava pelo telefone estava me vendo.
- Você está ao lado do gerente. Reclame com ele.


Ah! então o cara que me mandou ao lugar errado no dia anterior e me fez gastar os créditos do celular é o gerente? Nossa!

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Já de saco cheio, solto os cachorros no cidadão. Ele não deixa por menos e responde grosseiramente. Fico mais puto ainda.
- Além de me fazer de idiota o senhor ainda resolve gritar comigo?
- Você também está alterando a voz!
- Mas o que o senhor espera? Que eu esteja sorrindo depois de receber um monte de informações equivocadas?


Daí, depois de tanto estresse e de todo o público que estava dentro do banco assistir à minha irritação, o glorioso funcionário me manda para a gerência-geral. A senhora que me atende diz que sim, isso mesmo, sim, o processo começa na Caixa! Depois, o dinheiro pode até ser liberado no banco onde tenho conta.

Porém, a minha busca pelo FGTS terá outro capítulos. Agora tenho que providenciar um montão de documentos meus e do cidadão que vai me vender o apartamento. Se fosse para financiar, tudo seria mais fácil. A luta continua, companheiro!


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