Dia a Dia

Quando frustra ser jornalista

31 dez 1969 às 21:33

Da série bastidores da notícia

Há nove meses - coincidentemente o tempo de uma gestação - fiz uma matéria denunciando a venda de Cytotec, um medicamento abortivo proibido no Brasil, no camelódromo de Londrina.

Disfarçado, fui até lá e comprei quatro comprimidos por R$ 300. O aborto causado pelo Cytotec, que originalmente é produzido para curar úlceras gástricas, é terrível para a mãe e para o feto. Os comprimidos chegam ao Brasil contrabeados do Paraguai. Denúncia feita, formalmente encaminhei o caso ao Ministério Público. As polícias (Civil e Federal) também foram avisadas. Sabe o que as "otoridades" fizeram? Nada! Comprar o abortivo continua fácil... Tristeza!

Abaixo, o texto que foi publicado na FOLHA DE LONDRINA em abril de 2008.



Abortivo é vendido no Camelódromo de Londrina


Medicamento chega à cidade trazido do Paraguai



A informação partiu de um médico: gestantes estão comprando o medicamento Cytotec, que provoca aborto, no Shopping Popular da Rua Mato Grosso, conhecido como Camelódromo de Londrina. A reportagem da FOLHA checou e descobriu que realmente é possível comprar o abortivo - que tem a venda proibida nas farmácias de todo o Brasil - dentro do Camelódromo. O medicamento é originalmente produzido para prevenção de úlcera gástrica e duodenal.


Tarde de sexta-feira, 25 de abril de 2008. O repórter não encontrou dificuldades para adquirir quatro comprimidos do medicamento por R$ 300.


Escolhendo aleatoriamente uma das muitas bancas que existem no lugar, o jornalista perguntou ao rapaz que estava atrás do balcão se seria possível adquirir por ali alguns comprimidos de Cytotec. Inicialmente, o vendedor afirmou que não sabia sobre a existência de tal produto dentro do Shopping Popular. ''Esse remédio que você quer comprar é para causar aborto. Faz tempo que ninguém mais vende por aqui'', respondeu. Mas depois de o repórter informar que tinha uma quantia razoável de dinheiro no bolso para adquirir o produto, o rapaz voltou atrás e chamou o seu vizinho de banca, que saberia chegar ao vendedor.


O segundo rapaz foi direto ao ponto: ''Conheço quem tem os comprimidos, mas ele é ruim de negócio. O valor é R$ 300 e não tem conversa''. O jornalista pediu para ir até o vendedor, porém, foi informado de que não havia necessidade. ''É só entregar o dinheiro para mim que eu trago pra você'', rebateu.


Dito e feito. Com o dinheiro na mão, o vendedor logo voltou com quatro comprimidos de Cytotec embrulhados em papel de presente. A entrega foi feita em um corredor, distante da banca em que ele trabalha. As orientações dadas ao comprador são objetivas e assustadoras. ''Seguinte: são quatro comprimidos. Manda a menina ficar em jejum a partir das seis horas da tarde. Não pode comer nada durante a noite inteira. No dia seguinte, ela toma dois comprimidos e introduz os outros dois na vagina. Antes tem que lavar bem as mãos e enxugar com uma toalha limpa. Ela tem que estar deitada e só pode levantar lá pela 1 hora da tarde'', orientou.


''Mas ela não vai passar mal?'', questionou o jornalista. ''Não. Vai dar uma cólica mais forte, como se fosse uma menstruação, mas isso é normal. Quando 'descer', vai ser com bastante sangue. Diga para ela não se apavorar. Não precisa procurar médico. Depois que 'descer' é tranquilo, já era'', enfatizou.


A última pergunta do jornalista foi sobre a procura ao medicamento. ''Geralmente vem bastante gente... Mas eu não gosto de vender isso'', finalizou. Todos os diálogos foram gravados em áudio.

Em 30 de setembro de 2000, a FOLHA publicou uma matéria mostrando situação semelhante. A diferença é que há oito anos quatro comprimidos eram vendidos por R$ 80.


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