No ano passado, recebemos na FOLHA um e-mail de Vanessa de Oliveira, ex-garota de programa que sugeria ser entrevistada pelo jornal. Entrevistei-a, porém a matéria não foi publicada por razões editoriais. Porém, o material é interessante, principalmente pelo modo com que a moça fala sobre dinheiro. Como ainda tenho a entrevista gravada e a garota está lançando um novo livro: "Como seduzir clientes" (sugestivo, não?), publico o texto aqui no blog.
Em quatro anos, Vanessa de Oliveira atendeu 5 mil clientes. Hoje é autora de dois livros e empresária
''O dinheiro foi feito para as mulheres. Ele não teria sentido se elas não existissem.'' Essa frase, atribuída ao magnata grego Aristóteles Onassis, morto em 1975, durante muito tempo foi a ''jogada de marketing'' utilizada nos anúncios em jornais feitos por Marise, nome fictício de uma garota de programa de Balneário Camboriú-SC, que atendia homens dispostos a lhe pagar R$ 200 por uma hora de prazer.
Marise é uma das três personagens que ganhavam vida com Vanessa de Oliveira, 32 anos, uma ex-profissional do sexo, criativa e ambiciosa, que fez de seu corpo um produto - como ela mesmo diz - e, com um pensamento empresarial, se destacou em um mundo cheio de particularidades, mitos, preconceitos e perigos.
Longe da vida de prostituição há um ano, Vanessa já lançou dois livros: ''O diário de Marise'', onde conta, em 426 páginas, histórias vividas nos mais de 5,2 mil programas - devidamente registrados em um livro-caixa - que fez entre 2002 e 2006; e o mais recente deles, ''100 segredos de uma garota de programa'', que chegou no último mês às livrarias e promete revelar novidades sobre homens e sexo.
Além dos livros, a moça dedica-se ainda a escrever colunas para jornais e a divulgar uma linha de lingeries que leva o seu nome.
Na última semana, Vanessa atendeu a reportagem da FOLHA para contar a sua história. Simpática, de boa conversa, cheia de planos e falando diversas vezes sobre a ''importância fundamental do dinheiro para a vida de uma pessoa'', ela relatou como foi a sua experiência no lado mais ''nobre'' da prostituição.
Uma das cidades mais badaladas do litoral da região Sul do país, Balneário Camboriú já está acostumada a ver a sua população de 100 mil habitantes multiplicar algumas vezes em épocas de alta temporada. Gente de diversos lugares desembarca por lá, inclusive ''gringos'' em busca de sol e praia durante o dia e outros tipos de diversões quando chega a noite.
Nesse contexto, o trabalho como garota de programa pode ser mais seguro - atendendo somente em motéis e boates - em relação às condições de prostitutas que arriscam as suas vidas nas calçadas de muitas cidades. Isso sem falar na verdadeira escravidão sexual a qual são submetidas mulheres, adolescentes e crianças em muitos lugares desse país afora, principalmente nas regiões Norte e Nordeste.
''O cara que está a fim de aplicar algum golpe ou ser violento vai procurar as garotas ou travestis que ficam na rua. Eu sempre usava motéis. Esse tipo de estabelecimento protege as garotas, pois são elas que levam os homens até lá. Para mim, existe a profissional do sexo e a prostituição da profissional do sexo, que é o caso dessas pessoas que trabalham em condições precárias ou de escravidão'', ressalta.
Voltando a falar da história de Vanessa, o que mais chama a atenção é a maneira empresarial com que ela trabalhou durante o tempo em que foi garota de programa. Em um ritmo frenético, algumas vezes recebendo mais de 10 clientes em um mesmo dia, os rendimentos chegaram a R$ 20 mil por mês.
''Meus métodos são comparáveis aos de um empresário. Passei a desenvolver técnicas para ganhar mais na profissão e criei outras duas personagens para equilibrar meus negócios. A Marise era sofisticada e cara, por isso eu precisava ganhar na quantidade, então criei a Mari, que cobrava R$ 80 por programa. Depois inventei a Ana, que também cobrava R$ 80 mas atendia homens que gostavam de vibradores. Cada uma utilizava uma peruca diferente para que ninguém percebesse a 'tripla personalidade'. Assim, atingi diversos públicos, do magnata ao presidiário recém liberto; do médico ao matador de aluguel.''
Outra ''estratégia de vendas'' foi oferecer o serviço em duplas. Trabalhando em parceria com uma amiga e utilizando a frase ''Um é pouco, dois é bom, sexo a três é demais'', nos anúncios publicados em jornal, Vanessa viu seus rendimentos dobrarem. ''Descobrimos que sair com duas garotas ao mesmo tempo era a fantasia de muitos homens'', conta Vanessa.
Sobre o conceito social de discriminação quanto a quem vende o corpo para ganhar dinheiro, ela diz ter a consciência tranquila. ''Já aluguei meu corpo diversas vezes, mas nunca vendi a minha consciência. Sempre trabalhei honestamente e os homens que fizeram programa comigo estavam bem conscientes de que eu trocava sexo por dinheiro.''
Questionada se é possível para uma garota de programa sentir prazer, a resposta de Vanessa é surpreendente. ''O dinheiro é afrodisíaco. Eu senti prazer com aqueles clientes que me pagaram melhor.'', responde.
No entanto, nem tudo foram flores na vida de garota de programa de Vanessa. Com cinco celulares que não paravam de tocar, traições de colegas, a convivência com meninas que enfrentavam abortos para não ter a profissão prejudicada e a impossibilidade de viver um verdeiro amor a fizeram encerrar a carreira.
Porém, a ambição profissional continua a mesma. O primeiro livro de Vanessa de Oliveira vendeu 35 mil exemplares e ganhou versões em italiano e inglês, além de também ser vendido em Portugal. ''Agora quero colocar as minhas lingeries no mercado europeu'', finaliza.