Como prometi, segue a matéria sobre a geada. As fotos estão no post anterior.
O relógio aponta 5 horas da madrugada de quarta-feira (dia 3). O termômetro nas mãos do agricultor Valdemar Kawata, de Sapopema (132 km ao sul de Cornélio Procópio), registra 2ºC. O céu está estrelado. Vai começar uma batalha entre o homem e a natureza. Com a temperatura caindo a cada hora, Kawata sabe que três mil plantas de seu cafezal, que estão em uma área de baixada, correm perigo. No ano passado ele já sofreu uma triste derrota para a geada, sendo obrigado a cortar no tronco mil pés de café. Desta vez, espera sair pelo menos com um empate. Vai encarar o frio.
A FOLHA acompanhou o trabalho de Kawata na madrugada mais fria do ano no Paraná. No distrito de Entre Rios, que pertence ao município de Guarapuava (Campos Gerais), foi registrada a temperatura mais baixa do sul do Brasil. Por lá, a estação do Instituto Meteorológico Simepar detectou a mínima de -5,4ºC.
Em Sapopema, no sítio São Sebastião, o relógio agora marca 5h30 e a temperatura medida com o termômetro junto ao solo caiu ainda mais, está abaixo de zero: -0,5ºC. O semblante do cafeicultor descendente de japoneses é de total preocupação. O orvalho já está virando gelo nas folhas de seus cafezais. É hora do combate.
O aliado de Kawata contra a geada é um velho conhecido dos cafeicultores do Norte do Paraná para esse tipo de caso: o fogo. A meta é criar uma cortina de fumaça sobre o cafezal. A prática tem explicação científica. Segundo o meteorologista Cezar Gonçalves Duquia, do Simepar, acontece o seguinte: durante o dia, o sol aquece o bolsão de ar que fica junto ao solo, depositando ali energia. Quando o sol se põe, começa o processo inverso, com o solo emitindo energia para o espaço. Se houver nuvens no céu, parte dessa energia volta para o solo, mas com céu estrelado ela se perde. As nuvens de fumaça produzidas pelo fogo ajudam a armazenar energia, ou seja, calor. No sítio São Sebastião foram feitas três grandes fogueiras, com a lenha dos pés de café arrancados no ano passado. O fogo custou a pegar na madeira gelada, encoberta por uma fina camada de gelo, mas logo o barulho das labaredas ardendo romperam o silêncio da madrugada. Uma cortina de fumaça se formou, mas não impediu a presença do gelo nas folhas das plantas. Contudo, desta vez a geada não vai obrigar o cafeicultor a derrubar nenhum pé de café, vai resultar apenas em algumas folhas queimadas.
''Faço isso por gostar do café, da minha lavoura. Além disso, é um capital da minha família que está aí investido. Quando a geada nos castiga, é muito triste, pois em uma noite perdemos todo o trabalho de um ano. Na nossa batalha contra a geada, a natureza acaba vencendo na maioria das vezes, mas não podemos desanimar'', destaca o agricultor que comprou os 22,5 hectares onde trabalha com o dinheiro de quatro anos de trabalho como operário no japão. Ele também industrializa a maior parte de sua produção, colocando no mercado o café Sol Nascente.
Lágrimas nos olhos e água nas plantas
Em Londrina, no patrimônio Selva (região sul da cidade), o olericultor Eliel dos Santos Silva também lançou mão não só do fogo, mas de outros instrumentos para não perder suas hortaliças para o frio. Em 10 hectares de terra ele cultiva 26 variedades de verduras e legumes, abastecendo o mercado de Londrina, sul de São Paulo e Mato Grosso do Sul.
Habituado às geadas, ele só lamenta pelo fato de a temporada de frio de 2009 ter começado mais cedo. ''Nos anos anteriores estava geando em agosto e setembro'', comenta. No entanto, como não adianta lamentar, ele adiantou a colheita do que era possível, cobriu com sacos de estopa outra parte da roça e decidiu irrigar durante a madrugada o que fosse possível do restante.
Acostumado a passar as noites frias de termômetro nas mãos, Eliel já estava preocupado à 0h30, quando o aparelho marcava 4ºC. Às 3h40, a temperatura já havia caído para 0ºC e as bombas de irrigação tiveram que funcionar. ''Consegui salvar as abobrinhas e parte da horta de alface. Mas perdi muito
do couve e do próprio alface. Cheguei a ficar emocionado com a situação, pois vi que acabou dando resultado o trabalho meu e da minha família'', comemorou.
Também há explicação para a eficiência da irrigação. De acordo com o meteorologista Cezar Gonçalves Duquia, a água tem maior capacidade térmica do que o solo, assim, demorando mais tempo para perder energia, evitando que as folhas das hortaliças congelem.