Bondinho dos Livros

O MENINO MAROTO (Conto infantil)

06 nov 2011 às 12:05

Seu nome era Gabriel, mas todos o chamavam de menino Maroto. Ele não era um menino feliz. Por que? Porque na sua casa tudo mundo estava sempre zangado. E ele não era feliz. Se a torneira pingava, a mãe gritava. Se a comida queimava, o pai xingava. Se Gabrielinho fazia barulho, a mãe e o pai gritavam e o menino ia dormir sem comer como castigo. Coitado do menino Maroto!.. Não tinha onde ir. Não tinha com quem reclamar.

O menino Maroto, na verdade, só queria abraços, beijos, aplausos, elogios. Queria ser amado como os meninos das novelas da televisão. Também queria uma casa confortável, pais carinhosos, sair de férias. O menino Maroto queria tanta coisa!


Os pais continuavam brigando: O pai reclamava porque a carne não estava no ponto. O chão não tinha cera suficiente ou tinha cera demais. A mãe dizia que o pai era exigente.


Vejam o desenho que eu fiz! - dizia o menino contente com uma folha na mão e um desenho de papagaio muito colorido. Mas ninguém dava atenção para ele.
O menino fez um avião de papel, mas ninguém viu, ninguém aplaudiu... O menino sentia-se só, muito só.


O pais tinham uma lojinha. Trabalhavam até altas horas da noite e trabalhavam aos sábados e trabalhavam aos domingos. E trabalhavam nos feriados. Os pais nunca descansavam e estavam estressados. E o menino dizia: – Mãe olhe o desenho que eu fiz.


E a mãe gritava: – Não tenho tempo. E o menino pedia: – Por favor pai vamos jogar bola no parque. E o pai respondia: – Não tenho tempo.


E o menino foi ficando só. Só e triste. Triste e só. Ninguém dava atenção para ele.


O QUE DESCOBRIU O MENINO?


Um dia a mãe reclamou porque os brinquedos estavam fora da caixa. O pai reclamou porque o menino deixou os patins na sala. E o menino viu que para receber atenção tinha que fazer tudo errado, pois quando fazia tudo certo ninguém falava nada.


Quando fazia tudo errado ai gritavam com ele. Lembravam que ele existia.
No dia seguinte a mãe vestiu uma blusa nova, preta com muitas bolinhas brancas. Bolinhas brancas pequenas e grandes.
Como estou?
– Você parece uma cueca gigante! – disse o menino.
– Maroto! – gritou a mãe.
A tia Marilda trouxe um bolo de banana:
– Gosta de bolo de banana, Gabriel?
– Só gosto de bolo de chocolate da padaria. Você nem sabe mesmo fazer bolo.
– Maroto! – exclamou a tia.
E assim o menino Gabriel passou a ser chamado de Maroto.

O menino Maroto descobriu que para chamar a atenção dos pais tinha que ser maroto, fazer travessuras e contestar. Alguns criminosos que também gostam de chamar atenção, de ver seu retrato falado nas revistas, suas fotos na televisão, seu nome no jornal. E se fazem filmes da vida deles... ai eles enchem o peito de ar como sapos.


E nosso Maroto vai terminar assim? Não! O Menino Maroto tem bom coração.
Ele gosta de gatos e de cachorros. Ele ama os pais. Ele até acha simpática a sobrinha da vizinha, a Luizinha, que é uma menina obesa (e algumas crianças zombam dela), mas o Maroto fala que ela é simpática e fofinha. E até adotou um cachorro de rua. O Pretinho. O menino tem bom coração mesmo!




NA CASA


O pai gostava mesmo de tomar banhos de sol quando tinha um tempo livre. Nunca, nem um dia, brincou com o Gabriel. Às vezes sentavam para assistir TV ou trazia uma revista de presente para o filho ler, mas brincar. Isso não! Nunca.


E o dinheiro faltava em casa. A mãe trabalhava, o pai trabalhava, ainda assim o dinheiro sempre faltava. Quando o dinheiro entrava o pai gastava grande parte do dinheiro comprando CD de música, DVD e revistas. Tinha mais de 500 DVD, tinha filmes de para rir, para chorar, para pensar, para sonhar... e tinha mais de 1200 CD de música. Quando o menino contou isso para seus colegas de aulas, o André disse: Você gosta de contar vantagens. Vai tomar banho! gritou o Gabriel, zangado. E o André chamou-o de safado.


Assim tudo mundo começou a chamá-lo de menino Maroto e com o tempo até esqueceram seu nome. Era assim: Maroto, vamos brincar de bola? Maroto, vai comprar pão na padaria. Maroto, arrume sua cama.


E Gabriel, vendo que seu comportamento chamava a atenção das pessoas, começou a comportar-se como um Maroto mesmo. Seu apelido ficou Maroto, mas ele era um menino triste, era um menino que precisava de um abraço da mãe, de um abraço do pai.


O ANIVERSÁRIO DO MAROTO


No aniversário a tia Márcia perguntou o que ele queria ganhar no dia do aniversário. O Maroto queria um elefante. Mas a mãe disse que ele precisava de meias e cuecas.


Sabem o que o Maroto ganhou no aniversário? Cuecas! Cuecas brancas, cuecas pretas, cuecas vermelhas, cuecas azuis, cuecas verdes, cuecas marrons, cuecas amarelas... cuecas com listras, cuecas com bolinhas, cuecas com desenhos, cuecas lisas, cuecas... cuecas...



Sabem o que o Maroto ganhou no aniversário? Cuecas!


Onde está o Maroto? Perguntou o pai. Nesse momento a porta abriu-se e o Maroto entrou com o cachorro. A mãe deu um grito. A tia Marilda abriu a boca grande, grande como uma montanha, mas não disse nada. As crianças que ainda estavam tomando refrigerante e comendo bolo, riram.


O Maroto havia colocado cuecas cobrindo a bundinha do cachorro. Várias cuecas. Havia colocado meias nas patas e até uma cueca na cabeça.


O MENINO MAROTO CRESCEU


O menino Maroto cresceu e se tornou um cara bem interessante. Esquisito, sim, mas interessante. Com piercing no lábio superior, brinquinho na orelha esquerda, o cabelo comprido e as roupas estranhas. O Gabriel não fazia mal a ninguém, mas gostava de assustar e chocar as pessoas. Também gostava de pintar, de escrever poesia, de filosofar.


Aos 20 anos foi para Machu Picchu e encontrou um xamã descendente dos Incas, que tinha um rosto nobre e enrugado e usava um poncho escuro.


O xamã lhe disse:
– Você nunca foi safado, nem é estranho. Você sempre foi inteligente e maravilhoso. A sociedade moderna é uma sociedade doente. Para adaptar-se a essa sociedade muitos se transformam...


– Transformam-se de que maneira? – perguntou Gabriel.


– Alguns só pensam em comer, como os porcos; outros, só sabem fofocar e dizer palavras venenosas, como as cobras; outros se transformam em trapaceiros como as raposas e vivem enganando; outros em seres submissos, como os cachorros ou tristes, como os bois. Alguns se transformam em charlatães, como os papagaios e ficam falando e falando; outros, em seres vaidosos, como o pavão e ainda estão os seres solitários, como os lobos.

O xamã fez uma pausa e disse:
– Algo dentro de você é muito bom, muito brilhante e muito original.

Gabriel sentiu-se feliz e riu. E seu riso era lindo como o som dos sinos que tocam de manhã cedo.


– Que bicho sou eu? – perguntou Gabriel e nesse momento um condor de asas pretas, brilhantes sob o Sol, revoou sobre sua cabeça.

– Você é um Condor! – disse o xamã e Gabriel voltou a rir e seu riso era alegre. Um riso transparente, correnteza de rio que trazia alegria. O xamã olhou as montanhas e disse:


– O importante é amar a natureza, amar a humanidade e trabalhar para que o mundo seja um lugar melhor para se viver.

Gabriel voltou do Peru apoiando a teoria, que alguns cientistas defendem, de que a Terra é um ser vivo. Associou-se a uma ONG Ecológica – instituição que protege a natureza - e ainda hoje podemos vê-lo nas ruas do centro da cidade e nas praças, com seu piercing, com o cabelo comprido, com o brinquinho na orelha, discursando junto com seus amigos, sobre o aquecimento da Terra, o efeito estufa, a poluição e a necessidade de cuidar melhor de nosso planeta, a Pacha Mama dos Incas, a mãe Terra.


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