Bonde Briguet

Brasília ouve o Brasil e aprova o impeachment

18 abr 2016 às 00:40


Por Paulo Briguet

Desde as primeiras horas deste domingo (17), estava claro que 17 de abril seria um dia histórico. A dúvida era se os parlamentares escreveriam a história da esperança ou a do desencanto. Às 23h08, quando o deputado Bruno Araújo (PSDB-PE) anunciou o voto decisivo a favor do impeachment, a grande maioria da população brasileira respirou aliviada. Sem Dilma Rousseff, o Brasil terá o duro dever de se reconstruir. Não será uma reconstrução feita com tijolos e concreto; é uma reconstrução moral, cultural, espiritual, feita de princípios e valores. E o primeiro passo desta obra é uma demolição: colocar abaixo o muro que separa o Brasil de Brasília.


No gramado diante do Congresso, foi erguido um muro para separar os manifestantes pró e contra Dilma. A colocação do muro passava a falsa impressão de que o Brasil estava dividido em dois blocos monolíticos e equivalentes. Ora, a verdade é muito diferente. O que se vê é a imensa maioria da população brasileira contra uma elite umbilicalmente ligada aos benefícios do Estado, aos privilégios do estamento petista ou, no melhor dos casos, às ilusões ideológicas. A reportagem da FOLHA encontrou vários representantes dos dois lados em Brasília e sentiu o clima de animosidade.


Do lado de fora, 200 milhões de brasileiros. Do lado de dentro, 513 deputados e 81 senadores. A desvinculação entre esses dois ambientes — Brasília e o Brasil — é a essência da crise que vivemos. O isolamento dos políticos é algo tão perigoso que a própria Constituição Federal, em seu artigo 1°, afirma: "Todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição".


"Ou diretamente." Foi isso que o povo brasileiro seguiu nas grandes manifestações que deram respaldo à decisão do impeachment. Portanto, 17 de abril de 2016 não é uma data que passará solitariamente à história: com ela virão os também os inesquecíveis 15 de março de 2015 e 13 de março de 2016. Os protestos de rua foram fundamentais na escolha da esperança em vez da infâmia. Pela primeira vez, desde a redemocratização, o verde-amarelo superou o vermelho no balanço das manifestações. E o superou em larga escala. De nada adiantou que as lideranças petistas afirmassem o contrário. Ontem à tarde o senador Paulo Paim (PT-RS) dizia aos repórteres que "milhões" de brasileiros estavam nas ruas contra o impeachment. Os fatos não o confirmaram.


No Salão Verde da Câmara, pouco antes de começar a sessão de impeachment, encontro a deputada Mara Gabrilli (PSDB-SP). Cadeirante, a deputada tem a sua vida diretamente ligada ao marco inicial da era petista: o caso Celso Daniel. Ela e o pai – o empresário Luiz Alberto Gabrilli, falecido em 2011 – denunciaram o esquema de propinas no transporte público na Prefeitura de Santo André. "Nos últimos anos, essa organização criminosa cresceu em força e ousadia. Mas hoje começa a ser desmontada." Mara Gabrilli diz que a sua história pessoal a faz acreditar que o País vai superar a atual crise. "Eu só queria que meu pai estivesse aqui. Sem dúvida, ele estaria muito feliz", disse, emocionada.


A sessão de ontem começou em clima tenso, com troca de ofensas e gritos de guerra entre deputados pró e contra o impeachment. Os gritos de "Não vai ter golpe" e "Fora Dilma" interromperam a entrevista do presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ) pouco antes do início dos trabalhos. Alguns parlamentares quase foram às vias de fato.


Mas, assim que começou a votação, o clima ficou estranhamente calmo. Mesmo os mais ardorosos defensores do governo petista pareciam desanimados e até um pouco conformados com um resultado negativo, embora não abandonassem o bordão "Impeachment é golpe". Acusaram o golpe, nos dois sentidos da expressão.


Os três deputados federais de Londrina votaram a favor do impeachment. Para Luiz Carlos Hauly (PSDB), a responsabilidade será imensa para toda a oposição. "Se não iniciarmos com um pacto nacional, envolvendo todos os segmentos e mostrando a realidade dos dados fiscais, será um desastre retumbante". Alex Canziani (PTB), 4º secretário da Mesa Diretora da Câmara, trabalhou com a ideia de reconstrução do País e citou uma frase de D. Ivo Lorscheider: "O futuro não é um mero encontro dos astros, o futuro se constrói". Marcelo Belinati (PP) votou a favor do impeachment, mas fez uma ponderação: "A política brasileira está quase toda contaminada. O mais justo agora seria convocar eleições presidenciais para que pessoas novas assumam o poder no nosso País".

Ontem foi o Quarto Domingo da Ressurreição. Hoje é segunda-feira. Como disse um parlamentar no Salão Verde, o impeachment significa apenas o começo de um grande processo de reconstrução do País. O combate à cleptocracia exige muitas outras ações – como as reformas estruturais e o aprofundamento das investigações da Operação Lava Jato. Ontem, Brasília ouviu o Brasil. Agora, terá de ir ao encontro dele.


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