Beirada nipônica

Procurando os culpados

06 jul 2014 às 06:08

Gostaria de ter escrito esse texto assim que a seleção japonesa foi eliminada da Copa do Mundo, mas por problemas técnicos não consegui. Ainda assim, como a competição não terminou e os debates sobre as equipes continuam, acho que ainda dá tempo para falar um pouco da equipe japonesa.
A campanha foi ruim (duas derrotas e um empate), mas os resultados não foram diferentes de outras tantas equipes igualmente eliminadas. O que marcou foi à maneira como os japoneses perderam, ou melhor, deixaram de ganhar. Muitas vezes faltou coragem, outras vezes técnica, e em todas, vontade. E isso nunca foi passado ao público, apesar de evidente para quem assistiu às partidas.
A mídia japonesa tem por hábito não falar mal da seleção e os comentaristas convidados ou contratados são orientados para ver apenas os lados positivos da equipe. Portanto, nem sempre o que é passado ao público corresponde à realidade. Se você não disser o que eles esperam, possivelmente não será convidado da próxima vez ou não mais conseguirá trabalhos semelhantes num outro evento. Quer dizer, será colocado para escanteio só por dizer o que pensa. É tudo mais ou menos combinado. É uma espécie de ditadura com verniz de democracia.
Apesar de tudo, houve barulho por parte de uns poucos. Esses disseram que é hora de rever toda a estrutura do futebol, desde o trabalho de base até as equipes principais. Analisar os motivos das derrotas com inteligência e não tentar esconder os problemas embaixo do tapete.
O grande mal do futebol japonês está no trabalho de base, pois não há orientadores capacitados. Os erros maiores ocorrem na faixa etária de 11 a 16 anos, quando os meninos começam a apresentar interesse e evolução para o esporte. Nessa época, todos estão nas escolas e treina por suas equipes, só que o treinador é um professor de qualquer matéria, menos educação física. Quer dizer, os "técnicos" são professores das escolas, mas não necessariamente entendem de futebol, pois pelo sistema educacional daqui, todos os professores precisa ensinar um esporte como trabalho extracurricular. E aí pode acontecer de um professor de geografia ser o treinador de natação, outro de matemática estar com a equipe de vôlei e por aí vai. Nesse sistema, apenas aqueles que possuem talento nato conseguem se desenvolver um pouquinho mais, o restante vão ser engenheiros, médicos ou comerciantes (nada contra outras profissões, é claro).
A razão para a falta de renovação e a lapidação de jogadores talentosos não acontecer é isso. Os treinadores são professores de outras matérias e não possuem interesse suficiente para levar o projeto para frente.
Nas escolinhas de futebol a coisa é ainda pior porque os treinadores não possuem formação e são contratados como funcionários temporários ganhando por hora, sem vinculo empregatício com o clube. Como são temporários, assim que arrumam um outro trabalho, saem sem a menor cerimônia e deixam as crianças a ver navios.
Só que essa maneira de trabalhar e levar o esporte não foram citados por nenhum desses comentaristas e nunca ouvi ninguém falar que esse sistema pode estar atrasando a evolução do futebol no país. Mas está, e disso eu tenho certeza.
Como sempre, estão procurando um novo treinador para seleção principal, e acho que logo encontrarão porque aqui eles pagam bem e em dia, além do país oferecer tudo o que a equipe precisa, com exceção de atletas preparados.
Particularmente achei ótima a equipe voltar sem nenhuma vitória para que os envolvidos reflitam, mas pelo andar da carruagem acho que não vai dar em nada porque depois da eliminação nada mais foi mostrado. Até os programas esportivos pararam de transmitir a Copa e os comentaristas sumiram todos. Talvez estejam por aí procurando os culpados ou desapareceram de vergonha.

Nagatomo chora depois da eliminação


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